Ritualística é portadora de mensagens subliminares e provocação esotérica.
Charles Evaldo Boller
Diversidade
Até o momento, ao longo da história da Maçonaria universal,
estão compilados mais de duzentos ritos maçônicos diferentes, cada um com sua
própria ritualística. Considere-se que rito nada mais é que uso e costume
aprovado ou submissão a regramento externo imposto como forma de obediência.
Albert Galatin Mackey analisou o assunto e, da origem grega do verbete deduziu
que significa um caminho a ser trilhado, ou, por metáfora, um costume a ser
seguido.
Para se entender uso e costume atrelado a rito é bom
observar que, nas mais variadas sociedades espalhadas pelo mundo surgiram ritos
como de: passagem de uma casta para a outra, gravidez, nascimento, parto,
coragem do púbere, casamento, noivado, funerais etc. De prática social, os
ritos passaram a impor moralidades impostas pela religião, com o objetivo de
controlar o grupo social e seus rituais. A partir de confissões de fé a
religião sugere a prece cujo rito passa por encantamento, promessa, adoração e
oferenda.
Luz Maçônica e Individuação
Na Maçonaria o rito é procedimento para despertar Luz
maçônica através da passagem por séries de graus, que, ao afinal, se reduz a
método que verte do governo do rito. Essa Luz é algo que liberta. Tem o condão
de transmitir conhecimentos para a obtenção da Individuação, necessidade humana
estudada por gigantes pensadores da ciência da Psicologia e que trata de
conceitos básicos para dar ao indivíduo sentido prático e útil à vida em grupo.
De formas diferentes, cada rito maçônico visa a felicidade
geral da humanidade e colabora para a saúde psicológica do adepto. Essa busca
por saúde é resposta à pressão interna de unidade e identidade para sentir-se
bem. Uma das formas é o suprimento de visão da Verdade, apartada da cegueira do
fanatismo e do obscurantismo. Naturalmente ocorre equilíbrio dinâmico entre o
indivíduo e o meio social. A Individuação suporta a estrutura e funcionamento
de sua individualidade e estabelece limites para cada fase da vida. Para o
iniciado, essa saúde psicológica que orienta para a liberdade é focada desde os
primeiros passos de sua vida maçônica quando, num lance dramático, lhe oferecem
Luz para o entendimento e motivação para desenvolver sua Individuação.
É bela a perspectiva de desenvolver inúmeros momentos de
felicidade e saúde psicológica na prática dos rituais maçônicos. A ritualística
não oferece espaço para discussão vazia e desperdício de tempo útil com
detalhes e implicâncias insignificantes. Ela é utilizada para preparar o ambiente
para os objetivos nobres de espargir a Luz resultante de filosofar, debater e
instruir. A ritualística é simples uso e costume, codificação de cerimônias
apropriadas para estabelecer o ambiente respeitoso, particular, cerimonial e
impregnar o subconsciente com poder e eficiência real na obtenção da Luz. O
cerne da ritualística bem conduzida é a base para absorver a Luz, para a luta
pela liberdade das cadeias que a sociedade impõe cuja alforria leva
naturalmente ao exercício da Individuação.
Ritualística
A ritualística de cada rito é regulada por autoridade
hierárquica própria. Cada maçom a ela se submete por força de juramento, leis e
atos emanados de seus superiores. São instrumentos de obediência obrigatória
aos maçons de cada obediência. Não é ato tomado à revelia ou de boa vontade, é
obrigação! A História relata que, toda vez em que ocorreu rompimento do
respeito à ritualística surgiram cismas e ranger de dentes.
A ritualística caracteriza cada rito e não pode se fundir a
outros sem renunciar aos seus próprios usos e costumes. A legislação das
potências permite a cada loja a escolha do seu rito, independentemente do
número de graus de funcionamento e com a condição de que este rito seja
praticado com reverência e perfeição. Pretende-se obter unidade de doutrina em
cada rito. Cada loja é independente no que diz respeito a suas formalidades
administrativas e cíveis, mas é submissa a executar com precisão a ritualística
de seu rito. A formalização e o cuidado com a qualidade da ritualística
uniforme numa jurisdição prende-se a detalhes como: identificar a qualidade dos
iniciados; proteger os sentidos ocultos de cada grau; propor ações uteis à
moral; aplicar doutrina e as regras para disciplinar o cultivo da fraternidade;
e, principalmente, ações com o objetivo de proteger e uniformizar os ritos
debaixo de sua jurisdição. Ressalte-se que os rituais podem passar por revisões
e modificações, conforme a vontade e a critério das autoridades da jurisdição,
mas é prática que gradualmente tende a buscar apoio nos rituais mais antigos e
na evolução tecnológica, sem prejuízo do conteúdo esotérico. Nas grandes lojas
brasileiras existem esforços da Confederação da Maçonaria Simbólica do Brasil
para obter rituais uniformes em todos os estados da federação.
Ritos
Quatro são os ritos regulares mais praticados e tidos como
universais: simbólico ou azul; York ou moderno inglês; Schröder; e Rito Escocês
Antigo e Aceito. No Brasil predomina o Rito Escocês Antigo e Aceito com seus 33
graus, dividido em cinco séries de graus: simbólicos, 1-3; inefáveis ou de
perfeição, 4-14; capitulares ou históricos, 15-18; Kadosh ou filosóficos,
19-30; administrativos ou consistório, 31-33. Existe divisão de obediências
entre os graus simbólicos 1-3, subordinadas às grandes lojas e os demais graus,
4-33 do rito, são administrados por obediência separada e subordinado a um Supremo Conselho.
A diversidade de mais de duzentos ritos da Maçonaria implica
em sérias dificuldades para definir a origem da ordem maçônica. Existem
historiadores e autores que atribuem a origem a colégios de arquitetos e
pedreiros romanos de 715 a. C. Outros o debitam aos essênios e judeus na
construção do templo de Jerusalém. Existem vertentes que o creditam a Zoroastro
e até mesmo a Adão.
Complexidade que Divide
Que o tumulto de informações controversas não confunda a
cabeça do obreiro recém-chegado à porta do templo. Exemplificando: em tempo
recente houve cisão maçônica na Inglaterra entre Modernos e Antigos. O
desentendimento estava relacionado à divergências a respeito de detalhes
ritualísticos. As querelas chegaram a tal ponto que culminou na criação de nova
grande loja onde os causadores do rompimento foram detalhes como: omissão das
preces; descristianização do ritual, provado pelas Constituições de Anderson;
ignorar os diáconos; afastamento do antigo método de arrumar a loja; ignorância
e negligência dos dias santos com a realização das posses e das festas em dias
que não eram os de São João; omissão da preparação do candidato segundo o
costume; abreviação do ritual; negligência com as instruções; eliminação da
espada flamejante na cerimônia de iniciação; acabar com a cerimônia esotérica
da instalação de venerável mestre; etc. Aconteceu a separação. Passou o tempo.
Hoje a Maçonaria inglesa reconciliou-se, mas daquela cisão resultaram os Maçons
Antigos Livres e Aceitos, qualificação adotada hoje pelos membros de diversas obediências maçônicas.
Rito Escocês Antigo e Aceito
Quanto ao Rito Escocês Antigo e Aceito, este tem em sua
origem múltiplas controvérsias. Há historiadores que negam sua origem
prussiana, templária ou anterior. Seria mais acertada a assertiva que debita a
base fundamental ao Rito de Perfeição, de 25 graus criado em Paris, em 1756, no
Capítulo de Imperadores do Oriente e do Ocidente. Entre diversas guinadas foi
levado aos Estados Unidos da América. Reunidos em Charleston, Carolina do Sul,
distribuíram cargos, aumentaram os graus de 25 para 33, concentraram a
administração, e, em 31 de maio de 1801, fundaram o primeiro Supremo Conselho
do Rito Escocês Antigo e Aceito.
Em presença de tanta controvérsia fica difícil ver ordem no
caos. Para padronizar um ritual é justo e desejável que o mesmo seja perfeito e
igual em toda parte. Considerando a diversidade da Maçonaria é natural que isto
seja impossível, daí a ritualística ser profundamente afetada e diferente para
o mesmo rito em países diferentes e até em jurisdições assemelhadas como nas
grandes lojas do Brasil. Mesmo com todas essas realidades, embora as cerimônias
ou o ritual variar em diferentes períodos e em diversos países, a ciência, a
filosofia e o simbolismo continuam firmes em tornar feliz a humanidade pelo
amor.
Templo
O templo maçônico é local místico, cerimonioso e sagrado,
haja vista que foi ritualisticamente inaugurado. Não se confunda esse sagrado
com a sagração de um templo religioso. O maçom venera e respeita o templo
porque este representa o micro e o macrocosmo do homem em sentido lato. Dentro
do templo ocorrem cerimônias onde fluem energias cósmicas ou telúricas, de
Terra, do latim tellus, recebidas do Universo e que influenciam o planeta e sua
biosfera. A própria Terra gera energias cuja frequência são composição de
inúmeras fontes e beneficiam o homem. Os segredos esotéricos escondidos nos
rituais conduzem ao raciocínio de que basta entrar em ressonância com essas
frequências benéficas e absorve-las para manter a saúde psicológica e
espiritual, e, consequentemente, evoluir para estágios melhorados em si mesmo.
Utilidade da Ritualística
Albert Galatin Mackey, em sua enciclopédia, define
ritualística como o modo de abrir e fechar a loja, de conferir graus, de
instalar e desempenhar outros deveres e de constituir o sistema de cerimônias
extraído do ritual. Grande parte do ritual, independente do rito, é esotérica,
e, por isso, não deve ser transcrito, transmitindo-se o Conhecimento por
instrução oral. O ritual é apenas a forma externa e extrínseca do rito, a
doutrina da Maçonaria é a mesma, o corpo é invariável e permanece sempre e em
toda parte o mesmo. O ritual é o traje externo que cobre o corpo e está sujeito
a constante variação de acordo com a evolução tecnológica e social.
Independente do rito, a importância da ritualística é vital
ao desenvolvimento do maçom. Fazer-se presente à sessão é a oportunidade
individual de construir espaços repletos de energias que carregam a consciência
e o conhecimento de si mesmo. Trata-se de fenômeno que só pode ser sentido,
impossível de ser escrito ou explicado em palavras. Prodígio que acontece
naturalmente quando diversas pessoas se reúnem para o objetivo de serem felizes
e distribuírem felicidade aos outros. O maçom iniciado internamente reconhece a
importância em participar de cada reunião do grupo, maravilha que o motiva para
a vantagem prazerosa de consumir os frutos salutares da convivência que
alimenta a alma e modifica o ser. O júbilo de obter conhecimento é tanto que,
após a sessão, é normal desejarem continuar juntos para apreciar ágape festiva
que fortalece os laços de união.
O lado excelente e a utilidade da variedade de ritos são
óbvias: trata-se de forma natural para atender aos anseios da enorme massa
heterogênea e complexa de maçons que querem praticar o bem para a humanidade.
Considere-se que "toda a unanimidade é burra. Quem pensa com a unanimidade
não precisa pensar." (Nelson Rodrigues, 1912-1980). As divisões em ritos e
obediências são indício seguro que o maçom não é indiferente com a humanidade e
lhe deseja o melhor e nessa direção vale que "o oposto do amor não é o
ódio, mas a indiferença." (Elie Wiesel, 1928-1986).
Para honra e à glória do Grande Arquiteto do Universo, a
diversidade agrega valor para a atuação da Maçonaria em todos os cantos do
mundo, porque alimenta o espírito de todo homem desejoso de mudar a si mesmo em
busca da Individuação, e essa o modifica internamente. Com a sua própria
evolução o maçom modifica a sociedade para o bem.
Bibliografia
1. CASTELLANI, José, O Rito Escocês Antigo e Aceito, História, Doutrina e Prática, Cadernos de Estudos Maçônicos, 04, 1ª edição, Editora Maçônica a Trolha Limitada, 340 páginas, Londrina, 1988;
2. PROBER, Kurt, História do Supremo Conselho do Grau 33 do
Brasil, Volume 1, 1832 a 1927, 1ª edição, Kosmos, 405 páginas, Rio de Janeiro,
1981;
3. QUEIROZ, Álvaro de, A Maçonaria Esotérica, Rito Escocês
Antigo e Aceito, 1ª edição, Madras Editora Limitada, 158 páginas, São Paulo,
2016;
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