Como viver uma utopia.
Charles Evaldo Boller
A filosofia maçônica considera a possibilidade de se
praticar uma ética justa e perfeita, como um alvo a se atingir e não como
possibilidade real. Tem a ver com um jargão comum, usado entre os maçons, que a
cada sessão repete que os trabalhos foram justos e perfeitos, quando, em
verdade, isso é impossível.
Se os preceitos filosóficos que norteiam as relações humanas
contivessem pretensões de se obter o cumprimento de regras éticas, em condição
de serem justas e perfeitas, não haveria necessidade de palácios de justiça ao
redor do mundo. Todo ser humano compreenderia que a cada ação sua corresponde
uma reação. Se a ação fosse baseada no amor, o retorno nas relações
interpessoais, seria realizado na mesma moeda.
Mas o homem é extremamente competitivo, e cada um luta em
manter o comportamento que lhe dê vantagens, daí os ânimos se acirrarem e a
necessidade de se estabelecerem normas de conduta moral, que sustentem um
código de ética, para que a convivência tenha um mínimo de respeito a limites
preestabelecidos em leis; um recurso fraco inventado pelo homem para permitir
uma convivência pacífica relativa. Portanto, considerar a ética como justa e
perfeita é parte da visão idealizada da Maçonaria, com vistas a uma sociedade
utópica, mas plausível. Sonham com condições ideais, assemelhadas às relações
fraternas que vigoram dentro de seus templos.
A simples ideia justa e perfeita implica afirmar a
existência de respostas ao comportamento humano, em termos absolutos, que
estivessem desligadas das circunstancias envolvidas nas relações interpessoais,
na geopolítica, nos contextos e nas culturas. A ética é complexa e envolve
intrincado sistema de respostas para questionamentos contingentes e subjetivos.
A ética recebe impulsos de diversas fontes e fatores como,
cultura, crença, religião, sociedades, e, principalmente, das necessidades e
sonhos pessoais de posse, convivência e sobrevivência. Jean-Jacques Rousseau
ilumina uma causa grave de conflitos: "o primeiro homem que inventou de
cercar uma parcela de terra e dizer - isto é meu -, foi o autêntico fundador da
sociedade civil. De quantos crimes, guerras, assassínios, desgraças e horrores
teria livrado a humanidade se aquele, arrancando as cercas, tivesse gritado: -
não, impostor!".
O que é ético numa cultura pode ser reprovado por outra. O
estabelecimento de regras éticas, normalmente, é resultado de administração de
conflitos, valores, ideologias ou princípios impostos por dilemas
circunstanciais. Daí, não existe uma ética universalmente justa e perfeita, a
não ser, o que intuíram grandes avatares da humanidade como, Cristo, Sócrates,
Platão, Krishna, Moisés, Confúcio, Aristóteles e outros, que foram unânimes em
recomendar a única lei dada aos cristãos: a lei do amor.
Ética é resultado de convulsões sociais intensas que
envolvem filósofos, acadêmicos e elemento das sociedades em geral, que melhor
contemplem a vida em comum das mais variadas influências culturais e
comportamentais, ligados a situações particulares de cada grupo social, assim
como é objeto de debates e estudos da comunidade maçônica mundial.
A Maçonaria, do alto de séculos de prática da dinâmica
social, lançou a utopia de obter uma ética justa e perfeita, portanto,
absoluta. Não que ela venha a obter isso em sua plenitude, mas, apenas, para
fixar o rumo naquilo que o próprio homem estabelece, como sendo a vontade do
Grande Arquiteto do Universo, em seu projeto da criatura humana inteligente.
É utopia, sim! Entretanto, o objetivo é tornar feliz a
humanidade pelo amor, pelo respeito a diversidade do pensamento livre e à
crença de cada um. A crença no poder do amor pleno constitui outra utopia,
porque as variáveis são imensas e o comportamento humano dinâmico e emocional.
Por isso, nas oficinas maçônicas, são promovidos de forma continuada,
oportunidades de reflexão crítica, debates abertos e respeitosos, onde se colocam
em prática as palavras de um dos principais nomes do Iluminismo na França, o
irmão Voltaire: "não concordo com uma palavra do que você diz, mas
defenderei até a morte o seu direito de dizê-lo", citada ao livro de
Jean-jacques Rousseau, O Contrato Social. Então, cabe continuar a perseguição
de atingir a utopia de uma ética justa e perfeita baseada no amor fraterno, de
modo a desenvolver homens evoluídos, conforme o que se imagina ser o pensamento
e a ação do Grande Arquiteto do Universo.
A utópica ética justa e perfeita é alvo inatingível, mas o
maçom tem a felicidade de sonhar com algo inalcançável como a perfeição
absoluta, onde faz parte sonhar e trabalhar na busca contínua de uma hipotética
e utópica ética apoiada no amor fraterno, justo e perfeito. Tais sonhos
inatingíveis são a expressão íntima de busca da liberdade em termos ótimos,
utópicos. A discussão permanente da ética maçônica constitui um nobre objetivo
para a humanidade onde os obreiros da paz continuam a trabalhar em suas
oficinas como aquilo que foi intuído pelos grandes pensadores, do presente e do
passado, que gravaram seus pensamentos, para hoje e amanhã permitir uma vida
plena de realizações, vivendo na prática aquilo que o homem considera alinhado
ao projeto do Grande Projetista do Universo.
Bibliografia
Nenhum comentário:
Postar um comentário