domingo, 17 de setembro de 2023

A Utópica Ética Justa e Perfeita

Como viver uma utopia.

Charles Evaldo Boller


A filosofia maçônica considera a possibilidade de se praticar uma ética justa e perfeita, como um alvo a se atingir e não como possibilidade real. Tem a ver com um jargão comum, usado entre os maçons, que a cada sessão repete que os trabalhos foram justos e perfeitos, quando, em verdade, isso é impossível.

Se os preceitos filosóficos que norteiam as relações humanas contivessem pretensões de se obter o cumprimento de regras éticas, em condição de serem justas e perfeitas, não haveria necessidade de palácios de justiça ao redor do mundo. Todo ser humano compreenderia que a cada ação sua corresponde uma reação. Se a ação fosse baseada no amor, o retorno nas relações interpessoais, seria realizado na mesma moeda.

Mas o homem é extremamente competitivo, e cada um luta em manter o comportamento que lhe dê vantagens, daí os ânimos se acirrarem e a necessidade de se estabelecerem normas de conduta moral, que sustentem um código de ética, para que a convivência tenha um mínimo de respeito a limites preestabelecidos em leis; um recurso fraco inventado pelo homem para permitir uma convivência pacífica relativa. Portanto, considerar a ética como justa e perfeita é parte da visão idealizada da Maçonaria, com vistas a uma sociedade utópica, mas plausível. Sonham com condições ideais, assemelhadas às relações fraternas que vigoram dentro de seus templos.

A simples ideia justa e perfeita implica afirmar a existência de respostas ao comportamento humano, em termos absolutos, que estivessem desligadas das circunstancias envolvidas nas relações interpessoais, na geopolítica, nos contextos e nas culturas. A ética é complexa e envolve intrincado sistema de respostas para questionamentos contingentes e subjetivos.

A ética recebe impulsos de diversas fontes e fatores como, cultura, crença, religião, sociedades, e, principalmente, das necessidades e sonhos pessoais de posse, convivência e sobrevivência. Jean-Jacques Rousseau ilumina uma causa grave de conflitos: "o primeiro homem que inventou de cercar uma parcela de terra e dizer - isto é meu -, foi o autêntico fundador da sociedade civil. De quantos crimes, guerras, assassínios, desgraças e horrores teria livrado a humanidade se aquele, arrancando as cercas, tivesse gritado: - não, impostor!".

O que é ético numa cultura pode ser reprovado por outra. O estabelecimento de regras éticas, normalmente, é resultado de administração de conflitos, valores, ideologias ou princípios impostos por dilemas circunstanciais. Daí, não existe uma ética universalmente justa e perfeita, a não ser, o que intuíram grandes avatares da humanidade como, Cristo, Sócrates, Platão, Krishna, Moisés, Confúcio, Aristóteles e outros, que foram unânimes em recomendar a única lei dada aos cristãos: a lei do amor.

Ética é resultado de convulsões sociais intensas que envolvem filósofos, acadêmicos e elemento das sociedades em geral, que melhor contemplem a vida em comum das mais variadas influências culturais e comportamentais, ligados a situações particulares de cada grupo social, assim como é objeto de debates e estudos da comunidade maçônica mundial.

A Maçonaria, do alto de séculos de prática da dinâmica social, lançou a utopia de obter uma ética justa e perfeita, portanto, absoluta. Não que ela venha a obter isso em sua plenitude, mas, apenas, para fixar o rumo naquilo que o próprio homem estabelece, como sendo a vontade do Grande Arquiteto do Universo, em seu projeto da criatura humana inteligente.

É utopia, sim! Entretanto, o objetivo é tornar feliz a humanidade pelo amor, pelo respeito a diversidade do pensamento livre e à crença de cada um. A crença no poder do amor pleno constitui outra utopia, porque as variáveis são imensas e o comportamento humano dinâmico e emocional. Por isso, nas oficinas maçônicas, são promovidos de forma continuada, oportunidades de reflexão crítica, debates abertos e respeitosos, onde se colocam em prática as palavras de um dos principais nomes do Iluminismo na França, o irmão Voltaire: "não concordo com uma palavra do que você diz, mas defenderei até a morte o seu direito de dizê-lo", citada ao livro de Jean-jacques Rousseau, O Contrato Social. Então, cabe continuar a perseguição de atingir a utopia de uma ética justa e perfeita baseada no amor fraterno, de modo a desenvolver homens evoluídos, conforme o que se imagina ser o pensamento e a ação do Grande Arquiteto do Universo.

A utópica ética justa e perfeita é alvo inatingível, mas o maçom tem a felicidade de sonhar com algo inalcançável como a perfeição absoluta, onde faz parte sonhar e trabalhar na busca contínua de uma hipotética e utópica ética apoiada no amor fraterno, justo e perfeito. Tais sonhos inatingíveis são a expressão íntima de busca da liberdade em termos ótimos, utópicos. A discussão permanente da ética maçônica constitui um nobre objetivo para a humanidade onde os obreiros da paz continuam a trabalhar em suas oficinas como aquilo que foi intuído pelos grandes pensadores, do presente e do passado, que gravaram seus pensamentos, para hoje e amanhã permitir uma vida plena de realizações, vivendo na prática aquilo que o homem considera alinhado ao projeto do Grande Projetista do Universo.


Bibliografia

1. ABBAGNANO, Nicola, Dicionário de Filosofia, Dizionario DI Filosofia, tradução: Alfredo Bosi, ISBN 978-85-336-2356-9, quinta edição, Livraria Martins Fontes Editora Limitada, 1210 páginas, São Paulo, 2007;

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