segunda-feira, 18 de setembro de 2023

Maravilhas dos Símbolos e o Ócio Criativo

 Ócio criativo após as sessões.

Charles Evaldo Boller


Considerando o equipamento de comunicação, sensibilidade e habilidade de que o homem é provido, só isto já o faz reinar soberano nesta biosfera. Sua superioridade é aumentada ao colocar em prática a sua capacidade de sonhar, e, principalmente, de pensar com lógica e clareza.

Mesmo que sua construção emocional o construa com instintos que podem ser usados para bem e para o mal, ele desenvolve processos de interiorização que o defendem e transformam de besta cruel e sanguinária em criatura dócil e amorosa.

É neste desenvolvimento que a Maçonaria atua no maçom que realmente deseja ser pessoa de bem em sentido lato. Ao incentivar o pensamento com ilustrações e especulações racionais, ensina ao homem a favorecer-se de sua capacidade racional e lógica. O maçom aprende a pensar.

Pensar como fruto do próprio esforço e iniciativa é característica que a poucos seres humanos é dado fazer. Não que sejam indolentes para meditar sobre temas importantes, mas estão submetidos a um sistema cruel de sobrevivência e concorrência - pouco ou nenhum tempo resta para o indivíduo caminhar pelos meandros do pensamento especulativo.

Esta falta de tempo é agravada pelas ofertas do mundo da propaganda e do entretenimento passivo. A concorrência é tão intensa e os atrativos para atividades passivas são tantas, que a maioria fica impossibilitada de oportunidades para meditar e pensar. Cinema, televisão, joguinhos de computador e outras distrações roubam o tempo e viciam as pessoas em atividade que não exigem praticamente nenhum esforço e os impedem de desenvolver a capacidade de pensamento para a felicidade.

A Maçonaria usa símbolos e alegorias para fazer as pessoas pensarem. Todo aquele que é assíduo aos trabalhos em loja, praticamente sem esforço algum é conduzido pela caminhada dos símbolos e das estorinhas de fundo moral, que levam a pensar. Inclusive, por breves instantes, quando reunido em loja, o maçom é afastado dos laços alienantes do mercado consumidor para exercitar sua capacidade de pensar com lógica, filosofar, e, até, sonhar.

Um símbolo fala mais que palavras. Ele induz pensamentos completos que não são estáticos na linha do tempo, mas que se adaptam a cada situação, a cada estágio evolutivo da pessoa e da sociedade. O símbolo é o mesmo, a ideia que o circunda é diferente.

Uma alegoria representa de forma figurada expressões de pensamentos que se não forem traduzidas por ficções tornam-se difíceis, senão impossíveis de analisar com isenção.

Os preconceitos e referenciais da cultura induzem enveredar por caminhos tortuosos, difíceis e até errados.

Se a dificuldade for grande, a mente desiste e desliga o assunto. É semelhante a um ruído monótono e continuo; a mente desliga a capacidade de filtrar aquela informação e a pessoa consegue até dormir.

O homem usa de sua capacidade de contar estorinhas para transmitir conceitos de moral e ética complicados aos seus pares, consistindo na principal razão de o homem chegar ao ponto de evolução em que se encontra. Não fosse a sua maravilhosa capacidade de contar estorinhas ao redor das fogueiras desde o tempo das cavernas, não teria desenvolvido sua capacidade de pensar e até de sonhar.

A Maçonaria abraçou esta intuitiva capacidade de ensinar utilizando-se de símbolos e estorinhas. O maçom nem percebe que está evoluindo em sua capacidade latente de pensar com lógica.

Esta característica de transmitir conhecimento era usada pelos pedreiros operativos no projeto e ensino das tarefas da profissão. Depois do trabalho, duro e estafante, eles reuniam-se de modo fraternal em algum lugar confortável, e lá, ao sabor de bom vinho e boa comida sonhavam e trocavam ideias de como fazer e melhorar em sua arte de construir catedrais.

Os sábios que deram origem à Maçonaria perceberam isto e transportaram os hábitos e costumes daqueles pedreiros ao campo da especulação, na construção de catedrais que usam de pedras vivas para o aprimoramento de pedras vivas para edificar a sociedade. Em loja tratam do treinamento formal e disciplinado, e, após a reunião, em alegres reuniões, os irmãos discutem os mais variados temas de interesse comum do indivíduo ou da sociedade. Assim foi o berço das grandes ações desenvolvidas por maçons que alteraram de forma permanente a história.

É nos momentos de descontração que afloram os potenciais de pensar. Semelhante ao tempo em que não existia rádio e televisão, quando as pessoas conversavam e trocavam as mais valiosas informações para o seu crescimento intelectual, emocional e espiritual. É a prática daquela reunião familiar tão comum antes da Primeira Guerra Mundial. É uma sábia forma de escapar da alienação do sistema que escraviza e afasta o homem do seu estado natural selvagem.

O maçom que participa das atividades de sua loja, em todos os aspectos, se humaniza com mais facilidade. As duas atividades são importantes e complementares.

O ritual comportado e ordeiro das lojas e a descontração livre e solta após os trabalhos complementam-se.

É nos momentos de relaxamento que o maçom encontra solução para a maioria de seus problemas do cotidiano. Estes postulados são meticulosamente defendidos por Domenico de Masi e Bertrand Russell. Muitas vezes um simples comentário de um irmão dispara um processo racional para solução de problemas, que, até então, pareciam insolúveis. É a volta para o círculo das fogueiras praticado pelos vetustos homens das cavernas, um hábito que a poucos é dado desfrutar neste mundo recheado de artificialidades.

Muitas vezes uma pessoa que não está contaminada pela emoção ou submetida a um sentimento de culpa desperta soluções na mente do irmão que tem algum problema em sua casa ou escritório.

Em todas as oportunidades da vida moderna o cidadão é instado a preparar-se para o trabalho. São raras ou inexistentes as vezes em que é treinado para o ócio. Nas ágapes festivas após os trabalhos em loja, o maçom reúne-se com outros seres humanos e troca símbolos ou ideias que o ajudam na programação de sua vida profissional e familiar.

Há tempos, bem antes da loucura de nossas lides estafantes e alienantes que a Maçonaria trabalha assim, preparando o homem para usufruir bem os momentos de descontração. É o ócio criativo que possibilita e fomenta um futuro de qualidade e feliz para o ser humano.

Estes procedimentos complementares das reuniões nas lojas maçônicas liberam intelectualidade, energias psicológicas, morais, emocionais e espirituais. Existe um intercâmbio de sensações, emoções, símbolos e estorinhas que constroem o ser humano para fazer frente às vicissitudes da vida. Esta convivência pacífica e prazerosa desperta o poder dos símbolos latentes em cada intelecto e que foram treinados, até de forma subliminar, na reunião do templo.

Cada atitude exterior do maçom reflete uma disposição interior, que foi desenvolvida no templo. Os momentos de descontração e divertimento consolidam aquilo a que o maçom foi exposto em loja. É importante não sair correndo após os trabalhos da loja exatamente devido a esta característica de complementação do que se aprendeu no templo. Ambas as atividades tem igual importância na fixação de tudo o que se aprendeu. Se assim não ocorre na loja é porque existe algum problema que está dispersando os irmãos, e cabe aos os mestres maçons examinar quais os motivos que levam à debandada dos irmãos após os trabalhos. Motivos que podem ser de saúde física, a sinalização de simples apatia, e, até o perigo de degradação dos relacionamentos da irmandade ao ponto de culminar com abatimento de colunas. Além de tornar infrutífero tudo o que se desenvolveu durante a sessão.

A confraternização após os trabalhos da sessão é útil. É quando afloram as maravilhas dos símbolos e o ócio criativo em termos práticos. É o momento de gozar das delícias para as quais o corpo humano foi maravilhosamente projetado. Isto porque, o homem não foi feito para o trabalho abusivo e degradante, mas para em suas lides obter prazer e alegria.

Os orientais dizem que é devido ao cidadão encontrar um trabalho que ama que ele nunca mais trabalhará na vida.

É nos momentos de ócio que a mente humana cria as mais belas obras de arte, seja esta uma arte útil ou fútil.

O que interessa é fazer jus de ser maçom, desenvolver para fazer o bem, criar mais e melhores obras que influenciem a sociedade para a honra e à glória do Grande Arquiteto do Universo.


Bibliografia

1. MARKHAM, Ursula, Superando o Estresse, Um Guia Prático para Aprender a Lidar com as Pressões do Dia-a-dia, título original: Managing Stress, tradução: Débora da Silva Guimarães, ISBN 85-7123-425-6, primeira edição, 198 páginas, São Paulo, 1989;

2. MASI, Domenico de, O Futuro do Trabalho, Fadiga e Ócio na Sociedade Pós-industrial, título original: Il Futuro del Lavoro, tradução: Yadyr A. Figueiredo, ISBN 85-03-00682-0, nona edição, José Olympio Editora, 354 páginas, Rio de Janeiro, 1999;

3. MASI, Domenico de, O Ócio Criativo, tradução: Léa Manzi, ISBN 85-86796-45-X, primeira edição, Editora Sextante, 328 páginas, Rio de Janeiro, 2000;

4. PRATHER, Hugh, Não Leve a Vida Tão a Sério, Pequenas Mudanças para Você se Livrar de Grandes Problemas, título original: The Litle Book of Letting Go, tradução: Beatriz Sidou, ISBN 85-7542-047-X, nona edição, Editora Sextante, 156 páginas, Rio de Janeiro, 2003;

5. RUSSELL, Bertrand Arthur William, O Elogio ao Ócio, tradução: Pedro Jorgensen Júnior, ISBN 85-7542-020-8, terceira edição, Editora Sextante, 184 páginas, Rio de Janeiro, 1935;

6. RUSSELL, Bertrand Arthur William; MASI, Domenico de; LAFARGE, Paul, A Economia do Ócio, ISBN 85-86796-87-5, primeira edição, Editora Sextante, 184 páginas, Rio de Janeiro, 2001;

7. SILVA, Sérgio Milliet da Costa e, Montaigne, Ensaios, Volume 1, ISBN 85-13-01228-9, primeira edição, Editora Nova Cultural limitada., 512 páginas, São Paulo, 2004;

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