Mudança interna do maçom.
Charles Evaldo Boller
Na filosofia da antiguidade grega, a catarse constava na
libertação, expulsão ou purgação daquilo que é estranho à essência ou à
natureza de um ser e que, por esta razão, o corrompe. Em Maçonaria, com
treinamento e condicionamento, tenta-se induzir o adepto a expurgar de dentro
de si o que possui de rude e grosseiro, melhorando o que já possui de bom e
expondo um ser humano capaz de produzir para si e a sociedade grandes
benfeitorias, que de forma legítima pode denominar-se catarse maçônica.
Desde o momento em que entra na Maçonaria pelo Rito Escocês
Antigo e Aceito, o maçom é admoestado em só continuar sua jornada se realmente
estiver disposto em melhorar a si mesmo. Mesmo porque, ser maçom por
curiosidade é perda de tempo, pois todos os segredos da Maçonaria estão
amplamente revelados em centenas de livros espalhados pelas livrarias;
inclusive aquilo que muitos ainda consideram segredos da ordem como palavras
sagradas e de passe, passos, sinais de reconhecimento, toques e outros.
Buscar um ambiente social onde encontre amigos para
conversar também não justifica, haja vista existirem clubes sociais mais
glamorosos e chiques para se frequentar.
Distração é outro detalhe que não condiz com a presença nas
atividades em loja.
Conquistar relacionamentos para formar clientela para
atividades profissionais está totalmente fora de questão, apesar de os
relacionamentos abrirem as portas de certos gabinetes do poder e possibilitar
tráfego de influências.
Tampouco a satisfação de vaidades e busca por honrarias não
faz sentido para comprovar a presença do maçom num templo.
Apenas se justifica a assiduidade pela catarse maçônica.
Estão enganados os profanos que dizem todo maçom ser rico,
bom de vida porque é amparado por seus irmãos em seus negócios; uns para
driblar o fisco, outros para obter melhores contratos, e outras. Aquele que
vive a realidade da ordem maçônica sabe perfeitamente o quão distante esta
afirmativa está da realidade.
O maçom conquista seus recursos de subsistência com
dedicação e suor igual a qualquer cidadão. Por aplicar bons princípios na
circunvizinhança, conquista clientes e trabalho de valor pelo simples fato de
as pessoas confiarem mais nele pelo que ele é. Porque em todas as oportunidades
de sua vida profissional e social ele se comporta conforme o que aprendeu de
sua convivência com outros maçons, dentro e fora dos templos. Uma pessoa assim
não tem necessidade de expor sua condição de maçom, ela brilha por si mesma e
progride materialmente.
Do que aprende na convivência maçônica, leva para seu lar as
benesses de um pai, avô, tio, irmão, comportado e amoroso. Raramente se machuca
com pequenos detalhes de comportamento em sua relação conjugal, pois sua
condição de maçom o condiciona a estudar e pensar, a pensar antes de falar.
Aquele maçom que não acordou para esta realidade, certamente está perdendo
tempo ou adormecido em plena atividade.
Na Maçonaria é importante exercitar intimidade com a arte da
dúvida, ser rebelde e questionador de tudo pelo simples gosto de investigar a
verdade; inclusive questionar o ensinamento transmitido pelos rituais e
filosofias da própria ordem. Ficar acomodado e inerte é inútil, perda de tempo
para obter a catarse maçônica. As atividades o tornam hábil orador, debatedor
ardoroso e sempre instiga a expressão de pensamentos novos. Se isto não estiver
ocorrendo é porque tem algo errado com ele ou com a loja que frequenta.
Com esta atividade aliada a uma profunda espiritualidade,
culmina em transformar-se líder dentro e fora da Maçonaria. É a razão de tantos
maçons obterem destaque, enriquecerem em cultura, saúde, espiritualidade, e,
como consequência natural, obterem sucesso e recursos financeiros suficientes
para levar uma vida tranquila e de qualidade.
Na sociedade, os bons pensadores são assassinados já na
pré-escola, na universidade apenas rezam a missa de sétimo dia. Infelizmente a
escola só transmite conteúdo, encapsula o professor em metas que não preparam o
aluno para a vida; não ensinam a pensar. Alunos são tratados como se fossem
pendrives, lotam a memória deles com "coisas", enquanto isto a
inteligência é subutilizada.
Os debates na Maçonaria usam os centros de inteligência em
seus diversos níveis, enquanto a memória é apenas coadjuvante no processo. Num
debate reage-se em frações de segundos e arruma-se a casa da memória,
construindo novos e inusitados pensamentos nos eternos ciclos de tese, antítese
e síntese. Professores e alunos deveriam ser debatedores de ideias e não meros
repetidores destas.
O maçom entra no templo para divertir-se para valer e fixar
os princípios simples, porém profundos da filosofia maçônica, objetivando a
catarse maçônica. O sucesso do método maçônico atrela símbolos e alegorias ao
treinamento com disciplina para reeducação emocional. É um processo de formação
de bons pensadores em resposta de bons debates. Resgata-se um pouco do dano que
a escola fez.
Pena que alguns, profundamente afetados, adoentados pelo que
aprenderam nas escolas, não estão dotados para perceber e avaliar a
preciosidade do método da catarse maçônica. Limitam-se em repetirem aquilo que
as escolas fazem, entopem a memória dos obreiros com conteúdo ao lerem de forma
mecânica os rituais e suas instruções. Com isto, pouco ou nada acrescentam,
porque não desenvolvem a capacidade de pensar com discussões, questionamentos,
dúvidas, debates etc. É comum ouvir o mestre dizer ao aprendiz - tenha
paciência, você vai ver isto mais tarde; na maioria das vezes é medo de não ter
a resposta, porque este mestre está ciente que é apenas um repositório de
informações e não um pensador hábil que sabe utilizar-se da informação da
memória para modificá-la, adaptá-la a cada situação - pode até ter conteúdo,
mas desenvolveu pouca inteligência neste setor. E esta característica o
acompanha na vida fora da Maçonaria.
Somando espiritualidade, emoção e racionalidade o sucesso da
catarse maçônica é garantido até para os sem formação acadêmica; inteligência
não é questão de saber, mas de como usar do pouco para produzir muito.
Adicionalmente, também não é questão de falar muito, mas de falar o suficiente
com proficiência.
Sócrates era hábil utilizador de sua inteligência, pelo
diálogo convencia os outros e chegava até ao ponto de revelar um não saber com
sua ironia.
Platão fez uma demonstração - experiência maiêutica - onde
provava que o cérebro humano já contém o necessário de forma inata, bastando
para isto à pessoa apenas ser lembrada - foi quando por um diálogo, carregado
de ironia socrática, entabulada com um escravo, fez com que aquele
desenvolvesse o Teorema de Pitágoras.
O sofista Protágoras disse que "o homem interpreta a
natureza ao seu modo e conforme ditado por seus interesses"; sabe-se que
ele muda de posição quando interage com outros; é a tribo influindo no
indivíduo. É uma característica da psique que veio se desenvolvendo desde os
tempos das cavernas e está profundamente incrustada nos processos cognitivos do
homem de hoje. Utilizar-se desta, foi um grande estalo intuitivo dos
iluministas ao reunir pessoas, das mais diferentes crenças e formações para se
influenciarem mutuamente para o bem, na solução de problemas da humanidade.
A catarse maçônica é um método educacional voltado para a
saúde mental, o desenvolvimento da inteligência, da espiritualidade, da
sociabilização, e outras, mas principalmente voltada ao fomento do amor
fraterno, a única solução para todos os problemas da humanidade, para honra e à
glória do Grande Arquiteto do Universo.
Bibliografia
1. ANTISERI, Dario; REALE, Giovanni, História da Filosofia,
Antiguidade e Idade Média, Vol. 1, ISBN 85-349-0114-7, 1ª edição, Paulus, 670
páginas, São Paulo, 1990;
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