Ferramentas utilizadas na construção de templos internos.
Charles Evaldo Boller
Com relação à proposta da Maçonaria de reconstruir o
interior de um templo feito de carne e ossos, sendo esta extensão ou parte de
todas as partículas do Universo animadas com a mesma força ativa, usa-se do
exemplo da reconstrução do templo de Jerusalém, em forma de lenda, uma
alegoria. A constante reconstrução é com respeito a capacidades racionais,
psicológicas, emocionais, valores, princípios e a Metafísica do ser espiritual
que cada homem desenvolvido é. O homem é um ser material com uma componente
espiritual. A reconstrução diz respeito a uma reedificação interna constante
devido à destruição efetuada por vícios e paixões desenfreadas, bem como, para
relembrar valores adormecidos na memória. Este templo interior pode ser
reconstruído indefinidas vezes, dependente apenas de constância na atividade. O
local ideal para esta reconstrução interna deve constar de usufruto de amor e
paz, porque é só na tranquilidade de um ambiente fraterno e amoroso que o homem
se desenvolve para o bem. Esta construção interna, devidamente orientada,
resulta no acumulo de inestimáveis tesouros que levam o homem a somar para a
perenização da prevalência do bem no meio social em que vive.
Um ambiente cheio de angústia e terror quase impossibilita a
reconstrução; apenas homens com alta capacidade de concentração progridem onde
existe desorganização e agressividade. Num ambiente hostil e de alta
concorrência o homem também não tem oportunidade para se reconstruir
internamente. No mundo externo da Maçonaria, o aviltante sistema humano de
escravidão drena toda a força ativa até sobrar apenas bagaço. A ordem maçônica
tem como modificar esta realidade por provocar o maçom a efetuar reiteradas
reconstruções de seu templo interior com vistas a libertá-lo dos grilhões da
alienação do trabalho que escraviza e desvirtua a vida natural. Não que venha a
partir de então a não trabalhar, mas o conscientiza das outras necessidades que
dão sentido para a vida como: presença na família, diversão comedida, amizades
e principalmente as necessidades internas de satisfação com a vida.
São provocações no campo intelectual e das sensibilidades,
que despertam no indivíduo conhecimentos e percepções que ele já sabe, mas não
aplica por estarem adormecidas. Estudiosos concluíram que é impossível levar
educação de fora para dentro, daí a ênfase dada pela Maçonaria ao
"conhece-te a ti mesmo", de Sócrates (468 a. C. - 399 a. C.). Pode-se
introduzir conhecimento de fora para dentro, mas isto é impossível na educação
das necessidades internas; aquelas que despertam potenciais internos
sensitivos, emocionais e espirituais; esta informação já está lá, na assinatura
genética, e só pode ser despertada.
Para Platão (428 a. C. - 347 a. C.) foi difícil definir
aquilo que denominava alma inferior, ou os desejos e inclinações que levam à
escravidão ao sensível, que de sua ótica levam sempre ao erro; na alma superior
a racionalidade deveria desenvolver a capacidade de controlar paixões e
desejos, senão seria impossível desenvolver comportamento moral, ou despertar o
bem; é a noção de educação do homem naquilo com que a natureza já o proveu. O
maçom já possui todas as características que dele fazem um homem moral, mas carece
de aperfeiçoamento; é o que ele desenvolve nas constantes reconstruções de seu
eu interior. Na ausência de valores na circunvizinhança, para não perecer ou
submeter-se aos vícios e perigos, o homem que deseja reconstruir seu Universo
interior tem praticamente impossibilitada a atividade de reconstrução interna
porque precisa usar de toda a atenção e força para defender-se de ataques
externos.
Quando o predador, o inimigo, está perto, toda atenção é
dispensada para impossibilitar sua nefasta atuação. Situação vivida no
dia-a-dia do trabalhador, onde no local de trabalho a concorrência e a maldade
são permanentes caçadores de vítimas ao abate, para que outros possam
beneficiar-se do espaço que ocupa. E existem aqueles que trabalham tanto que
quase nada sobra para a convivência familiar, ou usufruir das coisas boas da
vida no tempo certo e sem exageros.
O maçom usa de ferramentas na reconstrução. Uma delas é a
trolha; pequena pá em forma triangular com a qual se assentam tijolos. A trolha
é símbolo do trabalho honesto. Mas como usar uma trolha de pedreiro para
reedificar internamente o homem? Tomada simbolicamente, esta pá de pedreiro tem
um papel importante na reconstrução interna porque sem a utilização simbólica
dela não é possível edificar o ambiente fraterno necessário para que cada um
possa trabalhar em si. Daí o maçom designar o seu lugar de reunião de templo,
um lugar de respeito onde trabalha em si mesmo e em seus relacionamentos
apaziguados com a trolha e outras ferramentas. Mesmo o mais ingênuo não
conspurca um local tão sagrado como o templo onde se reúne com outros irmãos e
todos trabalham em seus templos, construindo e reconstruindo. Ao estender este
raciocínio para o templo interior de cada um - o proprietário do mesmo nunca o
sujaria! Apenas um louco ou afetado faria qualquer coisa para prejudicar o
harmonioso funcionamento de seu templo. E destes existem multidões de
desinformados, principalmente no que afeta a cultura e os valores.
Apesar deste raciocínio, mesmo numa loja maçônica existem atritos
e tensões entre irmãos; todos são homens bons, mas imperfeitos; os mais sábios
já reconstruíram diversas vezes seus templos internos; são os que estão na
dianteira e iluminam o caminho aos menos experientes usando da trolha com
maestria. Este instrumento de trabalho é o símbolo da tolerância e indulgência
para com os erros dos irmãos; pequenas querelas que sempre acorrem entre os
homens; principalmente onde se analisam questões sensíveis da dinâmica da
sociedade. Normalmente estas discussões estão no plano das ideias e visando o
bem da comunidade da loja. A trolha é usada simbolicamente para desconsiderar
as pequenas imperfeições dos iguais. Ao "passar a trolha" por sobre
as imperfeições de seus irmãos o maçom está trabalhando igualmente em seu
templo interior e passa sobre eventual ofensa. Perdoa, esquece a injúria e
elimina o ressentimento.
No usar da trolha o exercício espiritual é intenso, ainda
mais que perdoar é característica de corajosos e não de fracos. O perdão é
definitivo e não um exercício de dissimulação que quando uma oportunidade
surgir, se existirem resquícios de ressentimento, estes eclodem em vingança. Ao
"passar a trolha" o maçom obtém um locar fraterno onde reunir-se, em
sendo homem bom, passa a permanentemente retrabalhar seu mundo interior
afastado do mundo exterior onde um sistema aviltante o escraviza. Desenvolvendo
virtudes como paciência e afabilidade criam-se ambientes propícios ao
desenvolvimento espiritual, é a busca do amor fraterno, a única solução de
todos os problemas da humanidade, conforme foi dito pelos grandes iniciados
através dos tempos. Perdoar de fato é ato de heroísmo e o resplandecer do amor,
é o desenvolvimento da nobreza da abnegação; de negar a si mesmo vantagens em
nome do bem comum.
Ao invés da vingança, o ser espiritualizado julga o próximo
com complacência e sem ódio, sabendo que também pode cometer os mesmos erros
daquele que eventualmente ofendeu. Consciente de sua imperfeição corre em
auxílio do próximo com mão de apoio e pratica a caridade. Com o despertar para
a constante reconstrução interna glorifica a criação e destaca o poder e a
glória da humanidade. Num mundo perfeito seria fácil usar da trolha para alisar
os próprios defeitos e os dos semelhantes, mas a realidade não é assim.
Quem desenvolve seu mundo interior carece também de andar
armado. Não para o ataque, mas para a defesa. Para reconstruir o templo
interior é necessário fazer frente a terríveis e insidiosos inimigos. Cabe
neste mundo real usar a trolha numa das mãos, enquanto na outra se porta uma
arma de defesa.
O pior inimigo somos nós mesmos, que nos sabotarmos em
resultado de vícios e paixões desenfreadas, e seguidamente destruímos nosso
templo interior; daí a necessidade de permanentes ações de reconstrução. Aos
inimigos externos até não é difícil combater; basta isolar-se daquela
influência, mas não deixam de ser perigosos porque usam de nossas fraquezas
para nos derrubar e enfraquecer. Normalmente são aqueles que estão mais perto,
os amigos e familiares, que exploram nosso coração, instintos e emoções e nos
fazem cair reiteradas vezes em erro. Como combater tais inimigos?
Sendo versátil. Numa mão a trolha e na outra a espada. É o
trabalho em si com a trolha e ao mesmo tempo combater o mal que nos é imposto à
convivência por influência do meio em que vivemos. Contra invejosos, insidiosos
e traiçoeiros usa-se simbolicamente da espada da justiça, para os que erram
contra nós usamos abnegada e carinhosamente da trolha; dois instrumentos muito
importantes para a busca da paz social.
Trabalhar a pedra é bom quando suas faces são lisas e não
causam atrito quando em contato com outras pedras. Por outro lado, como é
natural e a maioria das pedras possuem asperezas, não assentando corretamente
em seu espaço, invadindo o espaço que não lhes pertence, entra em ação a
trolha. Aplica-se a massa da tolerância entre as duas pedras, o que reduz
bastante o atrito com aqueles que ainda não obtiveram o grau de discernimento e
postura adequados para não friccionar suas asperezas nos que estão próximos e
desejam conviver para progredir na sua edificação interna. E se uma pedra
insiste em prejudicar a outra, entra em ação a espada, que empunhada e movida
com maestria, aplica a justiça e a diplomacia, o que espanta ou impede que as
asperezas de terceiros abusados prejudiquem o brilho da pedra de cada um. Dizem
que se as asperezas de uma pedra atritam a outra, e ambas persistem nesta
provocação, então, ao invés de uma pedra cúbica e bem esquadrejada, o resultado
será um pedra rolada de fundo de rio; sem forma definida e de comportamento que
não adquire estabilidade; rola ao sabor dos eventos aleatórios em direção ao
usufruto de uma vida vazia e sujeita a surpresas de chocar-se continuamente até
sobrar apenas um pedregulho; isto se não dispersar em forma de areia, resultando
um ser nulo, insignificante. A filosofia da Maçonaria possui cabedal de ideias
para obtenção do ambiente propício ao desenvolvimento interno do construtor
social; favorece o ambiente propício e calmo para trabalhar em paz o templo
interior da pedra que reconhece que o Grande Arquiteto do Universo certamente
muniu o homem com discernimento de avaliar a vantagem de praticar o amor
fraterno em todas as instâncias da vida.
Bibliografia
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