quarta-feira, 1 de outubro de 2025

Atribuição de Nomes aos Degraus dos Templos do Rito Escocês Antigo e Aceito

 Charles Evaldo Boller

Os dez degraus do templo ensinam que subir é servir, liderar é ouvir e amar é coroar a vida maçônica. Cada passo, da disciplina ao amor fraterno, revela a ascensão do homem em direção ao Grande Arquiteto do Universo.

Os dez degraus do templo do Rito Escocês Antigo e Aceito não são simples elementos arquitetônicos, mas símbolos de uma escada espiritual que conduz o maçom do silêncio do Aprendiz ao amor fraterno que coroa o Mestre. Cada degrau ensina uma lição: a disciplina do primeiro passo, o trabalho e a experiência do Companheiro, a tríade de sabedoria, força e beleza que sustenta o Venerável, e, por fim, os quatro degraus que ligam Oriente e Ocidente, lembrando a universalidade, a fraternidade, o serviço e o amor que unem a humanidade. Subir não significa dominar, mas servir; não é vanglória, mas humildade. Quem escala conscientemente os degraus transforma a Loja em escola de humanismo e projeta na sociedade os valores do Grande Arquiteto do Universo. No ápice da subida, o maçom descobre que todo caminho leva ao amor, síntese e perfeição de todas as virtudes.

No Rito Escocês Antigo e Aceito, tal como praticado pela maioria das Grandes lojas e Orientes regulares, os degraus dos templos NÃO possuem nomes oficiais ou designações ritualísticas fixas. Eles existem como elementos arquitetônicos e simbólicos do espaço, mas a tradição do Rito Escocês Antigo e Aceito NÃO ESTABELECE, em seus rituais canônicos, denominações específicas para cada degrau.

Entretanto, em algumas tradições maçônicas de outros ritos (por exemplo, o Rito de York ou certas variantes do Rito Moderno), encontramos escadas simbólicas com nomes e significados atribuídos aos degraus. Nesses casos, os degraus podem representar:

·         As Virtudes Teologais (Fé, Esperança e Caridade).

·         As Artes Liberais (Gramática, Retórica, Lógica, Aritmética, Geometria, Música e Astronomia).

·         As Três Luzes Maiores (Sabedoria, Força e Beleza).

·         As Três Idades do Maçom (Aprendiz, Companheiro e Mestre).

Muitos autores maçônicos, ao refletirem sobre o simbolismo dos dez degraus do templo no Rito Escocês Antigo e Aceito, atribuem interpretações livres, tais como:

·         Aprendizado (degrau do Segundo Vigilante).

·         2-3. Trabalho e Experiência (degraus do Primeiro Vigilante).

·         4-6. Sabedoria, Força e Beleza (degraus do Venerável Mestre).

·         7-10. Universalidade, União dos Pontos Cardeais e Harmonia (os quatro degraus que separam Oriente do Ocidente).

Assim, podemos dizer que NÃO há nomes oficiais para os degraus no Rito Escocês Antigo e Aceito, mas há leituras simbólicas possíveis: cada degrau pode ser associado a uma virtude, a uma etapa da vida maçônica ou a um princípio iniciático.

Interpretação Global

·         Degrau 1: base do Aprendiz.

·         Degraus 2 e 3: formação do Companheiro.

·         Degraus 4, 5 e 6: tríade do Mestre (Sabedoria, Força e Beleza).

·         Degraus 7 a 10: ponte universal, síntese do caminho maçônico, que leva ao serviço e ao amor fraterno.

Assim, os dez degraus podem ser entendidos como uma escada espiritual e pedagógica, que conduz o obreiro desde o início da sua formação até o ápice do ideal maçônico.

Os Degraus nos Templos do Rito Escocês Antigo e Aceito: Uma Leitura Simbólica

O templo maçônico, espaço sagrado e instrucional, constitui uma representação microcósmica do universo, onde cada detalhe arquitetônico possui função simbólica. Nada ali se encontra por acaso: cada objeto, cada posição, cada cor, cada palavra ritualizada serve para despertar a consciência do iniciado e para recordá-lo de sua jornada iniciática. Nesse contexto, os degraus do templo se tornam um convite permanente à reflexão.

No Rito Escocês Antigo e Aceito, há dez degraus distribuídos: um no altar do Segundo Vigilante, dois no altar do Primeiro Vigilante, três no trono do Venerável Mestre e quatro separando Oriente do Ocidente. Embora o rito não lhes atribua nomes oficiais, é legítimo, pela hermenêutica simbólica e pela prática andragógica, propor uma leitura filosófica que permita aos obreiros refletir sobre seu significado.

A seguir, desenvolvemos uma interpretação que associa a cada degrau um princípio ou virtude, compondo uma escada moral e espiritual que conduz do aprendizado inicial ao amor fraterno, ápice da vida maçônica.

O Primeiro Degrau: Disciplina

O primeiro degrau, localizado junto ao altar do Segundo Vigilante, é o degrau do Aprendiz. É o ponto de partida de toda jornada maçônica. A disciplina, aqui, não deve ser entendida como submissão cega, mas como capacidade de ouvir, de silenciar o próprio ego e de aprender.

O Aprendiz é chamado a dominar sua língua, seus impulsos e sua ansiedade de falar. Aprende a observar e a escutar. Essa disciplina não é servilismo, mas uma forma elevada de liberdade: quem não domina a si mesmo jamais poderá liderar ou servir ao próximo.

Filosoficamente, este degrau remete ao preceito socrático: "Conhece-te a ti mesmo". O primeiro passo não é impor-se sobre o outro, mas aprender a governar-se. Como lembra Epicteto, "ninguém é livre enquanto não for senhor de si". O Aprendiz, ao subir este degrau, dá o primeiro passo para a verdadeira liberdade.

O Segundo Degrau: Trabalho

O segundo degrau situa-se no altar do Primeiro Vigilante. Representa o ingresso do Companheiro, aquele que já superou a etapa inicial e começa a compreender a importância do trabalho como caminho de aperfeiçoamento.

Na Maçonaria, o trabalho não é mero labor físico ou profissional, mas esforço constante de lapidação do ser. O Companheiro é convidado a usar as ferramentas simbólicas para burilar a pedra bruta de sua personalidade. O trabalho é, portanto, um exercício permanente de autoconstrução.

Aqui se aplica a máxima aristotélica: "Somos aquilo que repetidamente fazemos. A excelência não é um ato, mas um hábito." O trabalho maçônico é hábito, repetição consciente de boas ações, que pouco a pouco molda o caráter do homem livre.

O Terceiro Degrau: Experiência

O terceiro degrau, também junto ao altar do Primeiro Vigilante, é continuidade do anterior. Se o segundo degrau é o trabalho, este é a experiência. O Companheiro não apenas trabalha, mas reflete sobre o que produz. Aprende a distinguir o erro do acerto, a avaliar os frutos de suas escolhas, a transformar o labor em sabedoria prática.

A experiência confere maturidade. Um Companheiro sem experiência é como um artesão que golpeia a pedra sem observar os efeitos de seus golpes. Já o Companheiro atento transforma cada ação em aprendizado.

Na perspectiva andragógica, este degrau representa a passagem do aprendizado passivo para o aprendizado ativo. O adulto aprende pela experiência. Cada erro em Loja é oportunidade de crescimento. A experiência converte-se, assim, em etapa indispensável da ascensão maçônica.

O Quarto Degrau: Sabedoria

No trono do Venerável Mestre, encontram-se três degraus. O primeiro deles é o da Sabedoria, que corresponde ao vértice da tríade fundamental da Maçonaria. O Mestre, ao subir este degrau, não se torna superior, mas responsável. Sua sabedoria não é privilégio, mas dever de orientar com prudência.

A sabedoria aqui não é mera erudição, mas a capacidade de discernir, de julgar com equilíbrio, de escolher a ação justa. É a sabedoria prática, que lembra Aristóteles em sua Ética a Nicômaco, onde descreve a phronesis (prudência) como a virtude que orienta todas as outras.

O Mestre sábio sabe ouvir antes de falar, sabe meditar antes de agir. É o exemplo vivo para os irmãos, pois ensina mais por sua conduta do que por suas palavras.

O Quinto Degrau: Força

O segundo degrau do trono do Venerável Mestre é a Força. A sabedoria precisa de energia para concretizar-se. A força não é violência, mas firmeza de caráter, coragem de manter princípios diante das adversidades, capacidade de sustentar a Loja e a si mesmo nos momentos de crise.

A força do Mestre não é autoritária. É força de serviço, semelhante à do pastor que protege seu rebanho. Lembra-nos São Tomás de Aquino, ao definir a fortaleza como virtude que nos permite enfrentar o medo e perseverar no bem.

Assim, a força do Mestre não oprime, mas ampara. É aquela que ergue os irmãos quando caem e sustenta a Loja quando esta vacila.

O Sexto Degrau: Beleza

O terceiro degrau do trono é o da Beleza, complemento da tríade. Se a sabedoria orienta e a força sustenta, a beleza coroa a obra. Não é a beleza estética superficial, mas a harmonia que resulta da ação equilibrada.

Na Loja, a beleza é expressa na liturgia, nos símbolos, nos rituais, mas principalmente na conduta harmoniosa entre os irmãos. A verdadeira beleza é fruto da união entre razão e coração, entre disciplina e amor.

Plotino, em suas Enéadas, ensina que a beleza é reflexo da unidade e da perfeição divina. O Mestre que alcança este degrau transforma a Loja em reflexo de ordem e harmonia, tornando-a pequena imagem do cosmos.

O Sétimo Degrau: Universalidade

Os quatro degraus que separam Oriente do Ocidente representam o esforço coletivo de unir mundos. O primeiro deles é o da Universalidade.

A Maçonaria não é religião, nem partido político, nem seita restrita a um grupo. É uma fraternidade universal, aberta a homens de todas as origens, credos e culturas. Subir este degrau significa reconhecer que o trabalho maçônico não se limita às paredes da Loja, mas se estende ao mundo.

O maçom que compreende a universalidade sabe que seu dever é para com toda a humanidade. Como escreveu Kant, cada ação deve ser guiada por máximas que possam valer como lei universal.

O Oitavo Degrau: Fraternidade

O oitavo degrau, ainda na passagem do Oriente ao Ocidente, é o da Fraternidade. Representa a união entre irmãos, fundamento essencial da Maçonaria.

Sem fraternidade, todos os outros degraus perdem sentido. A disciplina degenera em autoritarismo, o trabalho em exploração, a sabedoria em soberba, a força em tirania e a beleza em vaidade. A fraternidade é o cimento que une as pedras vivas do templo humano.

Rousseau, em seu Contrato Social, recorda que a sociedade só se sustenta pela fraternidade dos cidadãos. A Loja, como microcosmo, antecipa essa realidade: só prospera onde os irmãos se tratam como iguais e se reconhecem como partes de uma mesma família espiritual.

O Nono Degrau: Serviço

O nono degrau é o do Serviço. Ele recorda que a liderança maçônica não é privilégio, mas responsabilidade. O Mestre não se eleva para ser servido, mas para servir.

Este princípio aproxima-se da noção de liderança servidora, formulada por Robert Greenleaf. Para ele, o verdadeiro líder é aquele que serve primeiro, e que só é seguido porque coloca o bem dos outros acima de seus interesses pessoais.

O maçom que sobe este degrau aprende que sua vida não lhe pertence por completo: foi chamado a servir à Loja, à sociedade, à Pátria e à humanidade.

O Décimo Degrau: Amor Fraterno

O último degrau, o mais elevado, é o do Amor Fraterno. É o coroamento da escalada. Todas as virtudes anteriores convergem para este ponto.

Sem amor, a disciplina é tirania, o trabalho é escravidão, a experiência é cinismo, a sabedoria é arrogância, a força é opressão, a beleza é vaidade, a universalidade é abstração, a fraternidade é palavra vazia e o serviço é exploração.

Com amor, todas essas virtudes ganham vida e se tornam eficazes. O amor fraterno é o laço perfeito que une os irmãos e torna presente o Grande Arquiteto do Universo no templo. É, como dizia São Paulo, "o vínculo da perfeição".

A Liderança Nasce da Humildade

Os dez degraus do templo no Rito Escocês Antigo e Aceito, interpretados como símbolos, compõem uma escada iniciática que conduz o maçom do aprendizado inicial ao amor fraterno. Eles ensinam que a liderança nasce da humildade, que o poder é serviço, que a disciplina é liberdade, e que o ápice de toda escalada não é a glória pessoal, mas o amor que edifica a comunidade.

Na prática, esses degraus constituem uma pedagogia da vida adulta. Cada um deles é lição que se traduz em ação concreta na Loja e na sociedade. Assim, os templos maçônicos não são apenas construções arquitetônicas, mas escolas vivas de humanismo.

Bibliografia Comentada

1.      ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. Lisboa: Gulbenkian, 2004. Fundamenta a noção de hábito e excelência, útil para compreender os degraus do Trabalho e da Experiência;

2.      CÍCERO. De Officiis. São Paulo: Martins Fontes, 2005. Obra sobre o dever, relacionada ao degrau da Sabedoria e da Força;

3.      GREENLEAF, Robert. Servant Leadership. Nova York: Paulist Press, 1977. Texto clássico sobre liderança servidora, aplicado ao nono degrau (Serviço);

4.      KANT, Immanuel. Fundamentação da Metafísica dos Costumes. Lisboa: Edições 70, 1991. Defende o princípio da universalidade moral, associado ao sétimo degrau;

5.      KNOWLES, Malcolm. The Adult Learner. Houston: Gulf Publishing, 1980. Referência da andragogia, que sustenta a leitura dos degraus como método de ensino para adultos;

6.      MACNULTY, W. Kirk. Freemasonry: Symbols, Secrets, Significance. Londres: Thames & Hudson, 2006. Obra essencial sobre o simbolismo maçônico, incluindo análise arquitetônica do templo;

7.      PIKE, Albert. Morals and Dogma of the Ancient and Accepted Scottish Rite of Freemasonry. Charleston, 1871. Fonte clássica do Rito Escocês Antigo e Aceito, que inspira interpretações sobre virtude, sabedoria e liderança;

8.      PLOTINO. Enéadas. São Paulo: abril Cultural, 1973. Base filosófica para a noção de beleza como reflexo da unidade, relacionada ao sexto degrau;

9.      ROUSSEAU, Jean-Jacques. Do Contrato Social. Lisboa: Estampa, 1996. Fundamenta a ideia da fraternidade como base de toda sociedade, aplicada ao oitavo degrau;

10.  SPINOZA, Baruch. Ética. São Paulo: abril Cultural, 1979. Reforça a concepção de progresso ético por etapas, iluminando a leitura integral da escada dos dez degraus;

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