Charles Evaldo Boller
O grau 9 do Rito Escocês Antigo e Aceito,
denominado Mestre Eleito dos Nove, representa um momento de inflexão na jornada
maçônica. Trata-se de um grau de justiça, retidão e missão, onde se evidencia a
responsabilidade moral do iniciado diante da Verdade, da justiça e da reparação
do mal.
No plano simbólico, esse grau aponta para a
superação da vingança pela equidade, do ódio pelo discernimento e da ignorância
pela consciência desperta.
No plano prático, a sua filosofia é um fértil
terreno para semear valores essenciais ao adulto moderno — liberdade,
autonomia, liderança, ética, inteligência emocional e espiritualidade — que
dialogam com as exigências da vida familiar, profissional, intelectual e
iniciática.
Busca pela Liberdade e Autonomia no Grau 9
A liberdade, na perspectiva do Mestre Eleito dos
Nove, não é apenas uma condição exterior, mas, sobretudo, uma conquista
interior.
A missão simbólica do grau — fazer justiça sem
cair na armadilha da vingança — exige discernimento ético e liberdade de
julgamento. O iniciado, diante da tarefa de reparar uma injustiça, deve
libertar-se de paixões inferiores, como o ódio ou o desejo de revanche. Isso
implica um amadurecimento psíquico e emocional que o capacita a agir de modo
autônomo, guiado por valores superiores.
A autonomia, nesse contexto, é o reflexo da
liberdade bem compreendida. Trata-se da capacidade de deliberar com base em
princípios éticos próprios, internalizados pela reflexão e pela prática. Esse
valor é fundamental na vida adulta, seja nas decisões familiares, seja na
condução de negócios ou no exercício da cidadania. A filosofia do grau 9
encoraja o maçom a construir sua autonomia moral e espiritual como um ideal
constante.
Aspectos Econômicos e Controle Financeiro
Embora os temas econômicos não apareçam
explicitamente nos símbolos do grau 9, sua filosofia tem implicações práticas
nesse campo. A noção de justiça que perpassa o grau pode ser transposta para o
campo das finanças pessoais e empresariais, exigindo do maçom responsabilidade,
equidade e honestidade nas transações. O autocontrole que o grau demanda no
julgamento dos próprios impulsos se estende à administração racional dos
recursos.
O controle financeiro, nesse sentido, não é apenas
uma habilidade técnica, mas um desdobramento ético. Um adulto que busca o
equilíbrio financeiro também cultiva a moderação, a prudência e a
previsibilidade — valores que refletem a sabedoria que o Mestre Eleito dos Nove
é convidado a desenvolver.
Construção de um Ser Ético e Edificação Moral Ampla
O cerne do grau 9 está na ética. A missão do
iniciado é cumprir um dever moral que exige coragem, mas também temperança. O
grau propõe que a justiça não nasce da impulsividade, mas da reflexão
consciente e da virtude praticada. Dessa forma, contribui para a edificação de
um ser ético, cujo comportamento se orienta por valores superiores.
A edificação moral ampla, por sua vez, implica a
construção de uma vida baseada na integridade, na honra e no respeito ao outro.
Na sociedade contemporânea, marcada por relativismos éticos[1]
e polarizações, a filosofia do grau 9 é uma chamada à responsabilidade
individual e coletiva. O maçom é instado a ser exemplo de probidade, tanto na
vida pública quanto na privada.
Desenvolvimento da Liderança e Aplicações na Empresa
O Mestre Eleito dos Nove, ao assumir a
responsabilidade de corrigir uma injustiça, assume também uma função de
liderança. Trata-se de uma liderança ética, servidora e consciente do bem
comum. No mundo corporativo, esse modelo de liderança é cada vez mais
valorizado. Líderes que agem com retidão, discernimento e empatia são capazes
de transformar ambientes de trabalho e motivar equipes com base em valores e
não apenas em metas.
Seja como proprietário, gerente ou colaborador, o
maçom que internaliza os ensinamentos do grau 9 torna-se um agente de
equilíbrio, mediação e transformação nos contextos empresariais. Sua liderança
moral pode evitar conflitos, fomentar o diálogo e estabelecer uma cultura
organizacional mais humana e ética.
Apoio ao Desenvolvimento Humano na Família
A justiça, enquanto valor cultivado no grau 9,
também se manifesta no ambiente familiar. A figura do pai ou da mãe que age com
equilíbrio, justiça e empatia contribui decisivamente para o desenvolvimento
psíquico e moral dos filhos. O adulto que se esforça por viver os princípios do
Mestre Eleito dos Nove oferece aos seus familiares um modelo de maturidade e
amor incondicional.
Ao lado da esposa, esse maçom não apenas
compartilha a vida, mas também constrói um espaço de justiça afetiva, onde o
diálogo, o respeito mútuo e a escuta são cultivados. O lar torna-se, assim, uma
extensão do templo — um lugar de evolução, retificação e fraternidade.
Desenvolvimento da Inteligência e Livre-pensamento
O grau 9 desafia o iniciado a pensar criticamente.
O discernimento necessário para agir com justiça implica o desenvolvimento da
inteligência analítica, emocional e espiritual. A prática constante de
julgamento ético estimula a autonomia intelectual e favorece o livre-pensamento
— um dos pilares da Maçonaria.
Ser um livre-pensador é ser capaz de raciocinar
fora dos dogmas, com base na razão, na experiência e na reflexão
crítica. O Mestre Eleito dos Nove, ao examinar a legitimidade de suas ações
e intenções, desenvolve um espírito investigativo, avesso a fanatismos e
manipulações ideológicas.
Incremento Cultural e Vida Acadêmica
O estudo, como via de elevação, é compatível com a
filosofia do grau 9. A leitura de textos clássicos sobre ética, filosofia
moral, jurisprudência e espiritualidade é um meio eficaz de aprimoramento
cultural e de ampliação da consciência crítica. O maçom que frequenta ambientes
acadêmicos pode levar a esses espaços uma postura ética e dialogal inspirada
nos ensinamentos do grau.
O incremento cultural também se estende à vida
artística, à literatura, à música e às ciências humanas. O Mestre Eleito dos
Nove deve ser um homem culto, capaz de transitar por diferentes saberes,
estabelecendo pontes entre a tradição e a modernidade.
Educação Emocional e Andragogia
A justiça que o grau 9 exige não pode ser praticada
sem equilíbrio emocional. A educação das emoções — domínio das paixões,
reconhecimento das vulnerabilidades, capacidade de perdão — é um requisito
essencial. O maçom é chamado a desenvolver sua inteligência emocional para
julgar com empatia e agir com humanidade.
Nesse processo, a Andragogia — ciência da
aprendizagem de adultos — tem papel central. O aprendizado maçônico não se dá
por imposição, mas por motivação intrínseca. O grau 9 é especialmente fecundo
para a Andragogia porque estimula a reflexão sobre dilemas éticos reais,
promovendo a aprendizagem significativa e transformadora.
Diálogo com as Ciências Humanas e as Religiões Comparadas
A filosofia do grau 9 dialoga com diversas áreas do
saber. A sociologia, a psicologia, a filosofia moral e o direito oferecem
aportes valiosos para compreender a complexidade do ato de julgar e reparar. O
maçom pode enriquecer sua formação ética ao estudar teorias da justiça, como as
de John Rawls ou Amartya Sen, por exemplo.
Do mesmo modo, o diálogo com as religiões
comparadas oferece uma visão mais abrangente do valor da justiça na
espiritualidade universal. O Cristianismo, o Judaísmo, o Islamismo, o Hinduísmo
e o Budismo compartilham, com suas variações, a valorização da retidão, da
misericórdia e da ação justa. O Mestre Eleito dos Nove pode, assim, reconhecer
nos outros caminhos espirituais ecos de sua própria missão iniciática.
Transformação Interna, Consciência e Espiritualidade
O grau 9 é profundamente iniciático. O ato de
corrigir uma injustiça, de se confrontar com o mal e de superá-lo com
equilíbrio, é uma metáfora da luta interna do ser humano contra suas próprias
sombras. A transformação interior é o objetivo último desse grau: despertar uma
consciência justa, lúcida e compassiva.
Esse despertar não é apenas psicológico ou ético,
mas também espiritual. O Mestre Eleito dos Nove é chamado a despertar o ser
sagrado que habita em seu interior. A justiça, nesse contexto, não é apenas uma
virtude social, mas um atributo divino que deve ser manifestado na vida
concreta. O maçom se torna, assim, um instrumento da luz, um restaurador do
equilíbrio, um sacerdote da justiça universal.
Conclusão
O grau 9 do Rito Escocês Antigo e Aceito transcende
a narrativa simbólica da vingança e se transforma em um poderoso arquétipo de
transformação ética, emocional, intelectual e espiritual. Ao integrar os
ensinamentos desse grau à vida adulta, o maçom fortalece sua liberdade, sua
autonomia, sua consciência financeira, seu compromisso com a ética e sua
liderança moral.
Mais do que uma lição moral, o grau 9 é uma prática
de vida. Ele desafia o iniciado a tornar-se um restaurador da justiça em seu
lar, em seu trabalho, na sociedade e em si mesmo. Nessa jornada, os valores de
liberdade, cultura, espiritualidade e inteligência não são metas distantes, mas
instrumentos diários de elevação.
Bibliografia
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ALIGHIERI, Dante, A Divina Comédia, Tradução de
Italo Eugenio Mauro, São Paulo, Martin Claret, 2001;
2.
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3.
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de Janeiro, Jorge Zahar, 1994;
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Martins Fontes, 2001;
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KANT, Immanuel, Fundamentação da Metafísica dos
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MASLOW, Abraham, Motivação e personalidade, São
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8.
RAWLS, John, Uma teoria da justiça, São Paulo,
Martins Fontes, 2002;
9.
SEN, Amartya, A ideia de justiça, São Paulo,
Companhia das Letras, 2011;
10. SILVA,
Adilson, A espiritualidade na Maçonaria, São Paulo, Madras, 2014;
11. YOUNG,
Michael, Justiça e igualdade, Porto Alegre, L&PM, 2016;
[1]
O relativismo ético é uma corrente filosófica que defende que não
existem verdades morais universais e absolutas, ou seja, o que é considerado
certo ou errado pode variar de acordo com a cultura, a época ou a perspectiva
individual. Em outras palavras, a moralidade não é fixa e universal, mas sim
relativa aos contextos sociais e individuais;
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