Charles Evaldo Boller
O grau 5 do Rito Escocês Antigo e Aceito,
intitulado Mestre Perfeito, representa um momento simbólico de
reconstrução interior e aprofundamento moral no caminho do maçom. Após os quatro
primeiros graus, nos quais o maçom aprende as bases da construção do templo
interior, o quinto grau propõe a superação da dor, da perda e da desilusão,
direcionando o iniciado à perfeição ética, à justiça e à sabedoria aplicada.
Tal grau adquire especial relevância quando lido à luz das necessidades e
aspirações do adulto contemporâneo, em sua busca por liberdade, autonomia,
equilíbrio financeiro, liderança e desenvolvimento espiritual.
O Grau 5: Contexto Simbólico e Filosófico
O Mestre Perfeito é aquele que, diante da
ausência de seu mestre ideal, Hiram Abif, decide continuar a construção do templo
com retidão. Ele honra a memória e os ensinamentos de seu mestre não apenas com
sentimentos, mas com ações concretas. O grau trata do sepultamento digno de
Hiram, indicando que a dor pela perda deve ser transmutada em ação moral e
progresso contínuo. A simbologia do túmulo, da urna e das lágrimas não convida
à estagnação melancólica, mas ao reconhecimento do valor do mestre e ao
compromisso com os ideais mais elevados. O maçom, neste estágio, torna-se
guardião da virtude e da integridade moral.
Liberdade e Autonomia como Bases da Reconstrução
A busca pela liberdade, nesta fase, não é apenas
externa (política ou social), mas interna: a libertação dos apegos emocionais
destrutivos, do ego inflado, da escravidão do consumo e das paixões
desordenadas. O Mestre Perfeito compreende que liberdade é aquela
cultivada pela autodisciplina e pelo discernimento ético (Kant, 2003). Assim, o
grau favorece o desenvolvimento da autonomia, conceito central da Andragogia,
conforme definido por Knowles (1980), como a capacidade de se autogerir no
processo de aprendizagem e na vida.
Aplicações Econômicas e Controle Financeiro
A ética da responsabilidade, emergente neste grau,
possui implicações práticas na vida econômica. O maçom, ao tornar-se "perfeito",
deve gerenciar seus recursos com prudência, parcimônia e honestidade, pois
compreende que a estabilidade financeira é também um alicerce da liberdade. A
simbologia do túmulo e da memória de Hiram reforça a necessidade de se
valorizar o legado e o trabalho honesto. A consciência de que os bens são
transitórios orienta o Mestre Perfeito a priorizar investimentos no
conhecimento, na família e no progresso humano, reduzindo o apelo consumista e
aderindo a uma ética financeira madura (Sen, 1999).
Edificação Ética e Moral
A ética no grau 5 é elevada à condição de telos[1],
ou seja, de finalidade maior da ação humana. O maçom é chamado à perfeição
moral, compreendida como um processo contínuo de aperfeiçoamento interior.
Inspirando-se na tradição estoica e nos ensinamentos cristãos e judaicos que
permeiam o Rito Escocês Antigo e Aceito, o Mestre Perfeito assume o
compromisso de agir com justiça, lealdade e verdade. A moralidade aqui não é
apenas um conjunto de regras, mas um modo de ser que se expressa na vida
cotidiana: na palavra honrada, na responsabilidade profissional, na fidelidade
familiar e no respeito pelo outro (Macintyre, 2001).
Liderança Consciente e Responsável
No contexto simbólico do grau 5, o maçom é
convocado a liderar pelo exemplo. A liderança não é compreendida como dominação
ou prestígio, mas como serviço, inspiração e construção coletiva. Em sua
prática, o Mestre Perfeito deve ser capaz de influenciar positivamente seu
entorno: empresa, família, loja e comunidade. Ele assume posturas proativas,
promove o diálogo e estimula o desenvolvimento dos outros. Essa forma de
liderança está alinhada com o modelo da liderança servidora (Greenleaf, 2002),
em que o líder é, acima de tudo, um servidor da verdade e do bem comum.
Valores Aplicáveis à Vida Empresarial
Na vida empresarial, o grau oferece fundamentos
sólidos para o exercício ético e sustentável dos negócios. Como proprietário, o
Mestre Perfeito deve adotar práticas empresariais justas e humanizadas. Como
funcionário, deve agir com responsabilidade, comprometimento e honestidade.
Como gerente, deve integrar liderança com sensibilidade, inteligência emocional
e justiça. A retidão ensinada pelo grau é incompatível com a corrupção, a
exploração e a fraude. Assim, o maçom fortalece a cultura da integridade
organizacional e atua como agente de transformação nas instituições em que
opera (Friedman, 2005).
Fortalecimento da Família como Núcleo Humano
No âmbito familiar, o grau inspira o maçom a se
tornar um pilar de equilíbrio e sabedoria. A memória de Hiram, honrada no
ritual, ensina o valor da figura do mestre como guia, o que pode ser traduzido
em termos de paternidade consciente, companheirismo e dedicação à educação dos
filhos. A família é reconhecida como espaço privilegiado para a transmissão dos
valores morais, culturais e espirituais. A harmonia conjugal, o diálogo
intergeracional e a formação integral dos filhos são responsabilidades éticas
do Mestre Perfeito (Bauman, 2004).
Desenvolvimento da Inteligência e do Livre-Pensar
O grau propicia o aprimoramento da inteligência
racional, emocional e espiritual. A valorização da sabedoria prática (phronesis[2]),
em Aristóteles (2001), é aqui reafirmada. O Mestre Perfeito é incentivado a
refletir criticamente, estudar, questionar e buscar a verdade com humildade.
Esse processo leva à formação do ser livre-pensante, que não se submete
passivamente a dogmas, ideologias ou manipulações, mas busca o conhecimento com
discernimento. Trata-se da recuperação da razão ilustrada, aliada à
espiritualidade consciente (Habermas, 2003).
Incremento Cultural, Acadêmico e Científico
Na perspectiva do grau 5, o aprimoramento cultural
e científico é um dever moral. A formação contínua em diversas áreas do saber
contribui para o progresso individual e coletivo. A erudição não é vaidade, mas
ferramenta de serviço. O maçom deve ser agente de circulação de saber, de
democratização do conhecimento e de defesa da verdade científica em tempos de
negacionismo[3]. A
Maçonaria, como espaço de diálogo e investigação, pode fomentar grupos de
estudo, círculos de leitura e debates filosóficos que ampliem o repertório dos
irmãos (Morin, 2005).
Educação Emocional e Diálogo com as Ciências Humanas
A educação emocional é central na filosofia do
Mestre Perfeito. Ele deve aprender a reconhecer, regular e expressar suas
emoções com maturidade. A compaixão, o perdão e a empatia tornam-se virtudes
indispensáveis. O contato com as ciências humanas — psicologia, sociologia,
filosofia, história — contribui para ampliar a compreensão de si e do outro. O
diálogo com religiões comparadas favorece o respeito à diversidade espiritual,
fomentando uma espiritualidade ecumênica e integradora (Eliade, 2000).
Educação de Adultos e Andragogia
Como adulto em processo de aperfeiçoamento, o
Mestre Perfeito deve assumir o protagonismo de sua educação, conforme os
princípios da andragogia (Knowles, 1980). Ele aprende pela experiência, pela
reflexão e pela aplicação prática do conhecimento. A loja torna-se um espaço
privilegiado de aprendizagem colaborativa, onde o debate, o exemplo e o
testemunho são fontes de crescimento mútuo. Os valores transmitidos no grau são
consolidados quando internalizados pelo maçom adulto e aplicados em sua vida
concreta.
Progresso Maçônico e Transformação Interna
O progresso na Maçonaria exige transformação
interna. O grau 5 propõe um rito de passagem simbólico em que o maçom abandona
a imaturidade moral e assume a responsabilidade por seu aperfeiçoamento. O "túmulo"
de Hiram torna-se um símbolo de renascimento, indicando que todo aprendizado
maçônico visa não apenas o conhecimento, mas a conversão existencial. O Mestre
Perfeito não é aquele que sabe, mas aquele que vive o que aprendeu. Ele é
símbolo de coerência, humildade e serviço.
Despertar do Ser Sagrado e Desenvolvimento Espiritual
O grau estimula o despertar do sagrado que habita
no homem. Trata-se de um espiritualismo não dogmático, que reconhece o divino
na interioridade do ser e na ética do amor ao próximo. A espiritualidade do
Mestre Perfeito é ativa, operante, vinculada à prática da justiça e da verdade.
Ao se aproximar do "sagrado" — seja ele compreendido teologicamente
ou metafisicamente — o maçom transcende a banalidade e reencontra o sentido mais
profundo da existência (Assmann, 2000).
Considerações Finais
O grau 5 do Rito Escocês Antigo e Aceito, ao propor
a perfeição simbólica do mestre por meio da ação justa, da memória honrada e da
superação da dor, oferece ao adulto contemporâneo um guia para sua vida
prática. Liberdade, autonomia, ética, liderança, educação, espiritualidade e
desenvolvimento humano convergem na figura do Mestre Perfeito como arquétipo de
maturidade e plenitude. Seu exemplo inspira não apenas o progresso maçônico,
mas também o aperfeiçoamento da sociedade.
Bibliografia
1.
ARISTÓTELES, Ética a Nicômaco, São Paulo, abril
Cultural, 2001;
2.
ASSMANN, Jan, O preço do monoteísmo, São Paulo,
Unesp, 2000;
3.
BAUMAN, Zygmunt, Amor líquido, Sobre a
fragilidade dos laços humanos, Rio de Janeiro, Zahar, 2004;
4.
ELIADE, Mircea, O sagrado e o profano, São Paulo,
Martins Fontes, 2000;
5.
FRIEDMAN, Milton, Capitalismo e liberdade, São
Paulo, abril Cultural, 2005;
6.
GREENLEAF, Robert, O líder servidor, São Paulo,
Makron Books, 2002;
7.
HABERMAS, Jürgen, Consciência moral e agir
comunicativo, Lisboa, Instituto Piaget, 2003;
8.
KANT, Immanuel, Fundamentação da Metafísica dos
costumes, São Paulo, Martins Fontes, 2003;
9.
KNOWLES, Malcolm, The Adult Learner, A Neglected
Species, Houston, Gulf Publishing, 1980;
10. MACINTYRE,
Alasdair, Depois da virtude, São Paulo, Martins Fontes, 2001;
11. MORIN,
Edgar, Os sete saberes necessários à educação do futuro, São Paulo, Cortez,
2005;
12. SEN,
Amartya, Desenvolvimento como liberdade, São Paulo, Companhia das Letras, 1999;
[1]
Ponto ou estado de caráter atrativo ou concludente para o qual se move uma
realidade; finalidade, objetivo, alvo, destino. Fase final, derradeira; a
última parte, o remate;
[2]
Phronesis, em grego, significa sabedoria prática ou prudência. É a capacidade
de tomar decisões corretas em situações concretas, especialmente em relação à
ação moral e ao bem comum. Aristóteles considerava a phronesis uma virtude
intelectual essencial para a vida ética;
[3]
O negacionismo é a atitude de recusar a aceitação de fatos históricos ou
científicos comprovados, mesmo diante de evidências robustas. Em outras
palavras, é uma postura de recusa em reconhecer a validade de algo, geralmente
com base em crenças pessoais ou interesses, em vez de evidências;
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