Filosofar, a função mais nobre do maçom.
Ivair Ximenes Lopes e Charles Evaldo Boller
A filosofia da Maçonaria é o menos compreendido dos assuntos
relativos ao ofício. É relativamente fácil para o maçom obter conhecimento
razoável do simbolismo. No entanto, alguns irmãos, mais cedo ou mais tarde,
encontrarão a filosofia em sua busca do conhecimento no âmbito da Maçonaria, e,
ao fazê-lo, sentirão que, enquanto alguns de seus pares a entende, para eles
ela é incompreensível.
Há duas razões para isso:
- A visão quase universal de que os grandes filósofos do passado eram gigantes intelectuais, cujo pensamento está acima da compreensão do homem médio;
- A maioria, em dado momento, para sua edificação teve breve encontro com as obras de Platão, Sócrates ou as de outros filósofos, e, sem ninguém para guiá-lo, desistiu da leitura após alguns capítulos.
Como resultado, ele chega a pensar a filosofia como algo
apenas para uns poucos sortudos que podem compreendê-la.
Não há mistério na filosofia, ao contrário, é regra e guia
para o desenvolvimento de atitudes em relação a vida, atitudes boas ou não,
dependendo do indivíduo. Pode-se facilmente remover a sensação de que a
filosofia maçônica é incompreensível ao defini-la. O dicionário indica que a
filosofia é "a amizade, o amor ou a busca da sabedoria" dividida em
três ramos: natural, moral e metafísica.
Sabedoria é o uso inteligente do conhecimento ou do
julgamento. A inteligência determina ou limita a extensão do processo do
pensamento e governa a capacidade de retê-la. O conhecimento é fácil de
alcançar e é o mais barato a adquirir dentro das limitações da inteligência. Já
a sabedoria é desenvolvida ao longo da existência em resultado de trabalho com
disciplina, apoiado na inteligência que sabe usar o conhecimento.
Para entender a área onde dirigir esforços na busca da
sabedoria, examine-se a estória do Jardim do Éden. Perceba-se que essa alegoria
é utilizada há milhares de anos e ainda serve para diferenciar sabedoria de
estultícia. Em Gênesis 4, a serpente levou o fruto proibido da árvore da
sabedoria e o deu a Eva, que, por sua vez, o deu a Adão e ambos comeram do
mesmo. Quando Deus soube disso, Ele os expulsou do jardim, porque, depois de
terem comido do fruto proibido, eles haviam se tornado como Deus. Isso ilustra
que ao homem foi dado o poder de escolha, o livre-arbítrio. É neste campo de
escolha que se trabalha para atingir a sabedoria.
Considere-se alguns escritores de renome na filosofia
maçônica:
- William Preston, nasceu em Edimburgo, na Escócia, em 7 de agosto de 1742. Estava relacionado com a indústria de impressão, tornou-se maçom e foi mestre de sua loja aos 25 anos. A ele é creditada a construção das palestras de grau na forma que temos hoje, principalmente a palestra de companheiro. Vivendo em período de intelectualidade, era natural para ele pensar que o conhecimento com inteligência era a chave para a filosofia da Maçonaria.
- Karl Krause, nasceu perto de Leipzig, Alemanha, em 1781. Foi fundador de uma escola de direito e professor de Direito por anos. Escreveu extensivamente sobre Filosofia do Direito. Krause abordou a filosofia maçônica e argumentou que a manutenção da ordem social significa responsabilidade para o homem.
- George Oliver, nasceu na Inglaterra, em 5 de novembro de 1782. Mestre em Gramática na King Edward's School. Baseou sua filosofia maçônica na tradição, alegando que a Maçonaria pura foi ensinada por Seth aos seus descendentes antes da grande enchente, e que a Maçonaria é uma ciência filosófica tradicional.
- Albert Pike, nasceu em Boston, em 29 de dezembro de 1809. Para a filosofia maçônica abordou o assunto para além do real ou material: na Metafísica.
Tem havido outros maçons que têm escrito sobre a filosofia
maçônica. Cada um com seu próprio ponto de vista a respeito do assunto. Na
revisão do que eles escreveram é necessário ter em mente o tempo e as
circunstâncias em que viviam e quais foram ou são as influências sobre seu
raciocínio.
Sabedoria é o objetivo da busca do maçom. Em que área
buscar, uma vez que a Maçonaria é ciência do rico simbolismo auxiliado por
alegorias em que o conhecimento é velado nos rituais.
Símbolos são objetos materiais usados para expressar
pensamentos, ideias ou preceitos. Ao longo do tempo mantem-se fixo o símbolo,
mas muda a sua interpretação filosófica.
Alegorias são usadas da mesma maneira que os símbolos. Elas
são símbolos de imagem ou figuras de linguagem. Alegorias podem envolver
pessoa, coisa ou acontecimento ou a combinação das três. A partir dessas
figuras de linguagem derivam as especulações filosóficas. E como acontece com
os símbolos, mantem-se inalterada a alegoria, mas a interpretação filosófica
muda na linha do tempo. Utilizando-se de rica coleção destes elementos
simbólicos, cada maçom desenvolve, dentro de si, lições compatíveis com os
modos de comportamento condizente a um homem bom e verdadeiro.
Desta forma, utilizando-se dos símbolos e alegorias
imutáveis na linha do tempo, mas adaptando a sua interpretação filosófica
mediante meditação e convivência com outros irmãos, o obreiro atinge a
sabedoria.
Filosofar é tornar-se amigo da sabedoria, tanto no presente
como no futuro. Ao especulador, que coloca dúvida naquilo que seus sensores
oferecem e submetido aos mais variados padrões morais de seu tempo, que o
controlam e guiam, acorrem intuições que desenvolvem a sabedoria. E isso se
aplica a qualquer filosofia que desenvolva dentro de si mesmo, desde que o
exercício mental modifique sua conduta influenciada pelos conviventes, costumes
e padrões de sua época.
Como se aplica a filosofia maçônica?
O alicerce é a certeza da existência de um Princípio Criador
que criou todas as criaturas com livre-arbítrio. Apoiado nisso, cabe ao homem
fazer o bem para si e ao próximo. É claro que as escolhas nem sempre contemplam
aquilo que é certo, pelo fato de a vida, em presença da competição por
recursos, desenvolver-se em ambiente hostil para a vida. Num recinto assim, ter
acesso à livre escolha não é garantia de perfeição, o que só acontece com o
desenvolvimento da sabedoria. E isso só é possível quando se aplica parcela de
tempo ao filosofar, algo que acontece dentro dos templos maçônicos. É por isso
que o alvo principal do maçom é a sabedoria, ser amigo dela.
O ponto dentro do círculo ajuda a filosofar, ou especular no
desenvolvimento da sabedoria. A ilustração lança a percepção de que o homem
precisa de latitude em pensamento, palavra e ação. É a busca do ponto de
equilíbrio em presença das emoções que, no homem, se estendem da profundidade
até o topo. Em algum lugar entre os extremos é o ponto de equilíbrio perfeito,
onde se encontra a felicidade e a realização completa.
Entretanto, há situações em que as circunstâncias exigem que
o ponto de ação seja deslocado para cima ou para baixo. Este movimento é
governado pelo pensamento e influenciado por conjunto de circunstâncias. Se o
pensamento é controlado, assim também são as emoções. Criar o local de repouso
ou ponto de equilíbrio é a sabedoria em ação: trata-se de estabelecer controle
a partir do ponto dentro do círculo.
O círculo estabelece o limite além do qual não se deve ir para
não se aventurar em áreas onde se ignoram as consequências: seria falta de
sabedoria. Ao filosofar, o maçom estabelece as dimensões do círculo pelo efeito
limitante dos seus valores, princípios e experiência de vida, a partir disso, a
sabedoria o leva a encontrar a felicidade. Embora o indivíduo seja rude e
grosseiro ou cortês e polido, pelo simbolismo maçônico ele pode definir o
limite que determina o que é justo e reto.
A ilustração do círculo e o ponto ressalta a
responsabilidade individual para consigo e semelhantes. A necessidade de
controle dos pensamentos em exercícios contínuos pelo filosofar maçônico educa
desejos e paixões, mantem a fraternidade para o convívio social em paz. Pelo
exercício frequente, cada maçom analisa a si mesmo. Usa cada símbolo, alegoria
ou ilustração para aumentar a sua sabedoria, algo dirigido pela inteligente
aplicação do conhecimento da filosofia maçônica. Com esta formará sua filosofia
pessoal e, com isso, encontrará a sabedoria. Assim, terá vida mais rica e plena
para honra e à glória do Grande Arquiteto do Universo.
Bibliografia
BENOÎT, Pierre; VAUX, Roland de, A Bíblia de Jerusalém,
título original: La Sainte Bible, tradução: Samuel Martins Barbosa, primeira
edição, Edições Paulinas, 1663 páginas, São Paulo, 1973;
FONSECA, Geraldo Ribeiro da, A Egolatria e o Escopo Ético da
Maçonaria, Cadernos de Pesquisas, 27, ISBN 978-85-7252-344-8, primeira edição,
Editora Maçônica a Trolha Limitada, 224 páginas, Londrina, 2015;
LOPES, Ivair Ximenes, adaptada, modificada e sintetizada de
uma peça de arquitetura de autor desconhecido;
PARANÁ, Grande Loja do, Ritual do Grau 01, Aprendiz Maçom,
Rito Escocês Antigo e Aceito, primeira edição, Grande Loja do Paraná, 126
páginas, Curitiba, 2013;
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