quarta-feira, 7 de maio de 2025

Rito, Conhecimento e Despertar do Ser Interior

 Charles Evaldo Boller

 

Desde suas origens veladas nas brumas do tempo, a Maçonaria tem sido compreendida por muitos como uma instituição revestida de simbolismo, ritos e solenidades. No entanto, à medida que o iniciado adentra o processo formativo da Arte Real, torna-se evidente que os rituais, por mais solenes e enigmáticos que sejam, não constituem um fim em si mesmos. Pelo contrário, representam apenas a superfície simbólica de uma jornada muito mais profunda: a do autoconhecimento e do despertar interior.

 

A formação maçônica, quando verdadeiramente compreendida e vivenciada, conduz o neófito a uma transmutação interna. Não se trata de acumular graus ou decorar catecismos, mas de fazer da pedra bruta — símbolo do homem em sua condição natural — uma pedra polida, apta a integrar o Templo da Humanidade. Essa lapidação é um trabalho contínuo, árduo e profundamente pessoal. Nela, o maçom não é apenas espectador do rito; ele se torna agente da própria transformação, transmutando a ritualística externa em vivência interna.

 

Nos primeiros contatos com a Maçonaria, o neófito frequentemente se deslumbra com os símbolos, os paramentos e as palavras de passe. Contudo, à medida que progride nos mistérios, percebe que tais elementos não têm valor enquanto meros ornamentos cerimoniais. Eles são chaves, arquétipos, instrumentos de contemplação e de trabalho interior. O esquadro, o compasso, o nível e o prumo são, antes de tudo, instrumentos do espírito, destinados a orientar a conduta moral e filosófica do iniciado.

 

A ritualística maçônica, com sua precisão quase litúrgica, tem por função primordial preparar o ambiente interior do ser humano para a introspecção e a elevação. Cada passo dado no templo, cada vela acesa, cada palavra proferida em silêncio ou em voz, é um convite ao silêncio interior, ao esvaziamento do ego e à conexão com os princípios universais. A loja torna-se, então, um espelho da alma: ali, no espaço sagrado da fraternidade, o maçom confronta seus próprios vícios, paixões e ignorâncias.

 

A partir dessa consciência, a Maçonaria deixa de ser percebida apenas como uma fraternidade ritualística e passa a ser reconhecida como uma escola iniciática. Nela, o verdadeiro aprendizado é aquele que incide sobre o ser. O iniciado aprende a se conhecer, a conhecer o outro e, por conseguinte, a reconhecer o Sagrado presente na criação. Essa tríade — conhecer-se, reconhecer o outro e intuir o divino — configura o cerne do processo iniciático. E é nesse caminho que a Maçonaria revela sua função espiritual mais elevada.

 

O despertar interior ao qual a Maçonaria convida não é um evento pontual, mas um processo gradual, contínuo e vitalício. Trata-se de uma iluminação progressiva, na qual o véu da ignorância vai sendo paulatinamente levantado. O maçom desperto é aquele que compreende que o maior templo não é construído com pedras físicas, mas com virtudes. É aquele que compreende que o Grande Arquiteto do Universo não é um dogma, mas um princípio cósmico e ético que estrutura o ser e o cosmos em harmonia.

 

Assim, a formação maçônica se revela como um caminho de autoconstrução. O iniciado é simultaneamente o pedreiro e a pedra. Ele ergue a si mesmo, edifica seu caráter, constrói sua consciência moral. E esse edifício interior não se levanta em isolamento: a fraternidade é o solo fértil onde essa construção se torna possível, pois é no convívio com os irmãos que o maçom exercita a tolerância, a humildade, a paciência e a caridade.

 

Superando a dimensão superficial do rito, o verdadeiro maçom compreende que cada iniciação, cada reunião, cada símbolo, são convites ao recolhimento interior e à prática cotidiana da ética. A Maçonaria não é um refúgio para vaidades, mas uma escola silenciosa onde os homens aprendem a ser mais humanos, mais conscientes e mais livres. Por isso, a senda maçônica é, em última instância, um caminho de libertação — não de algemas exteriores, mas das prisões do próprio ego.

 

Conclui-se, portanto, que a Maçonaria, quando corretamente vivida, transcende os limites do formalismo ritual. Ela é, sobretudo, um processo de despertar. Despertar para si, para o outro e para o mistério. É nesta senda que o homem deixa de ser apenas um portador do avental e torna-se um verdadeiro operário da Luz.

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