sábado, 13 de dezembro de 2025

O Círculo Vivo do Zodíaco Maçônico

 Charles Evaldo Boller

O Zodíaco que Desperta o Centro do Ser

As doze colunas zodiacais do templo maçônico, erguidas no Ocidente como vigias silenciosas, formam um círculo simbólico que convida o iniciado a uma jornada que transcende o mero olhar sobre o céu. Elas não predizem destinos, mas iluminam o caminho interior daquele que busca compreender a si mesmo como ponte viva entre o mundo material e o espiritual. Cada coluna é uma metáfora em repouso, carregando lembranças de tradições antigas, do hermetismo às filosofias gregas, e, ao mesmo tempo, repetindo descobertas modernas da física quântica, que sugerem que o observador participa ativamente da construção da realidade.

Ao circular esse zodíaco, o maçom percorre não o cosmos, mas sua própria consciência em expansão, num movimento que o conduz do ruído do exterior ao silêncio luminoso do centro. Nesse ponto interior, encontra não respostas definitivas, mas um Universo ainda mais vasto, onde o macrocosmo revela-se refletido no microcosmo humano. A leitura desse ensaio amplia essa jornada: mostra como ciência, mito, religião e filosofia convergem no espaço ritualístico, transformando as colunas em instrumentos de técnica de ensino e espelhos de autoconhecimento. O leitor é convidado a atravessar esse círculo simbólico, permitindo que as colunas também despertem em si a busca por sentido, Verdade e transcendência.

O Zodíaco como Arquitetura Simbólica do Despertar

No templo maçônico do Rito Escocês Antigo e Aceito, as doze colunas zodiacais erguem-se no Ocidente como sentinelas de pedra e Luz. São mais que ornamentos: são marcos energéticos da jornada interior do iniciado, espécie de bússola cósmica que orienta a travessia do mundo material ao espiritual. Cada coluna guarda, em sua iconografia, ecos dos quatro elementos aristotélicos e das sete luzes planetárias que guiaram egípcios, caldeus, gregos e tantos outros povos na longa história da relação entre céu e homem.

Apesar de pertencerem a uma cosmologia milenar construída antes da astronomia moderna, essas colunas não têm função astrológica. Elas não predizem a vida; apenas iluminam o caminho daquele que busca construí-la com lucidez e consciência. Constituem, assim, o alfabeto simbólico de uma didática silenciosa, que o maçom decifra não com a mente apenas, mas com a totalidade do ser.

A Loja, quando assim decorada, converte-se em um imenso mapa celeste projetado sobre o mundo humano, no qual cada signo se torna uma porta para virtudes, desafios, limites e possibilidades. O zodíaco, outrora usado para prever as cheias do Nilo, agora prevê o ritmo do próprio aperfeiçoamento.

O Homem como Ponte Entre Terra e Céu

Todos os povos antigos, de chineses a astecas, buscaram compreender como o cosmos influenciava a frágil película da biosfera, essa membrana viva que hoje chamamos de Gaia. A Mãe-Terra, vista como organismo vivo, movia-se em sincronia com forças gravitacionais, eletromagnéticas e energéticas que só mais tarde seriam descritas pela ciência. Para muitos desses povos, prever o comportamento do céu era a única forma de garantir a sobrevivência.

Aos olhos do iniciado contemporâneo, contudo, esse antigo conhecimento ganha outro significado. O Hermetismo ensinava que "assim como é acima, é abaixo; assim como é dentro, é fora" antecipando a ideia moderna de que o homem é um microcosmo que reflete o macrocosmo. O maçom, ao contemplar as colunas zodiacais, não procura decifrar o futuro, mas reencontrar-se como ponte entre os dois mundos: o visível e o invisível.

A física quântica oferece metáforas instigantes para essa percepção. Se o átomo é "vazio" e a matéria é apenas vibração condensada, então o homem não é apenas corpo, mas campo de possibilidades. Ele se torna, como sugerem alguns físicos contemporâneos, um "observador-participante", cuja consciência influencia a própria realidade. Essa noção reflete do templo quando o iniciado, situado entre as colunas, percebe que o Universo que observa é também o Universo que o molda.

Hermetismo, Simbolismo e a Tecnologia do Espírito

O saber hermético, atribuído a Hermes Trismegisto e ao deus egípcio Thot, consolidou-se na Antiguidade como uma tecnologia do espírito. Seus iniciados eram sacerdotes, filósofos, alquimistas, detentores de um conhecimento que unia ciência, magia, matemática e psicologia, antes que tais áreas fossem separadas artificialmente. O sigilo desses mestres não tinha como objetivo ocultar poder, mas proteger o profano da incompreensão.

As colunas zodiacais, nesse contexto, não são artefatos supersticiosos. São heranças simbólicas dessa tradição. Cada signo representa uma configuração arquetípica do ser, como se o zodíaco fosse uma mandala do desenvolvimento humano. A instrução maçônica adota esses símbolos não para determinar personalidades, mas para estimular o estudo da condição humana em suas múltiplas facetas.

O iniciado contempla Áries e reflete sobre o impulso de início. Em Libra, reencontra o valor do equilíbrio. Em Capricórnio, compreende a disciplina da ascensão. Esses arquétipos constituem metáforas vivas das etapas da jornada interior, tal como as estações do ano traduzem o ritmo oculto da Terra.

Colunas no Ocidente: o Limite e a Oportunidade

Que todas as colunas estejam posicionadas no Ocidente não é um acaso arquitetônico. No simbolismo universal, o Ocidente representa o limite do visível, a fronteira entre o dia e a noite, a região onde a consciência material encontra o mistério espiritual. É um portal de crepúsculo, lugar de passagens e transformações.

O iniciado, ao adentrar a Loja, percebe que as colunas estão fixadas em alinhamento físico com as paredes, mas dispostas simbolicamente em um círculo sem centro aparente. Ele, porém, descobre que o centro é ele mesmo. O homem torna-se o eixo do mundo, o observador que define a direção da sua própria caminhada. Assim, o zodíaco torna-se um mapa que gira ao redor do observador. A jornada começa quando ele descobre que é o ponto imóvel no interior do movimento.

O círculo zodiacal é limitado, porque simboliza o mundo da forma. Mas é também ilimitado, porque a imaginação do iniciado pode expandi-lo como quiser. Este paradoxo lembra o ensinamento aristotélico de ato e potência: o círculo é ato enquanto arquitetura, mas potência enquanto símbolo. É o homem que o atualiza com sua consciência.

O Mito como Método do Despertar

A Maçonaria, como as antigas escolas de mistérios, compreende que a Verdade não se transmite por definições, mas por narrativas. Por isso, usa lendas, alegorias e ficções como espelhos em sua técnica de ensino. As colunas zodiacais não fogem a essa função. São lendas silenciosas moldadas em madeira, pedra ou metal. São guardiãs de um método cognitivo baseado na metáfora, no silêncio e na contemplação.

Platão, ao narrar o mito da Caverna, ensinou que o homem só se liberta quando descobre que as sombras não são a realidade. As colunas são como aquelas sombras invertidas: são símbolos que apontam para algo além deles. Servem para provocar o pensamento, não para encerrá-lo. A formação iniciática sabe que o ensinamento que o homem descobre por si mesmo é mais duradouro do que qualquer doutrina imposta.

O Templo como Laboratório de Física Espiritual

O centro do templo é o espaço de menor agitação, lugar da calma interior. Nele se encontra o delta radiante, a letra G, o esquadro e o compasso, o livro da lei. Esses símbolos formam uma triangulação sutil de energia moral, espiritual e intelectual.

O maçom ocupa esse centro. A partir dali, percorre a circunferência zodiacal como quem explora a borda de um Universo em expansão. Cada coluna representa uma parte do cosmos, mas também um aspecto do psiquismo humano. Quando segue essa órbita imaginária, o iniciado reflete sobre sua própria presença no Universo e percebe que seu caminho não tem início nem fim definidos. O movimento circular simboliza o eterno tornar-se real.

Na física moderna, especialmente nas interpretações cosmológicas, o Universo é descrito como expansão contínua. A cada instante, o cosmos cria mais espaço. O iniciado, ao explorar o zodíaco, cria mais consciência. A analogia é clara: o Universo fora expande-se como o Universo dentro. O templo, assim, funciona como laboratório da física espiritual humana.

O Caminho do Esquadro ao Compasso

O zodíaco no Ocidente simboliza o caminho que parte da materialidade (o esquadro) para a espiritualidade (o compasso). É a passagem da rigidez da forma para a liberdade da ideia, da causalidade mecânica para a causalidade moral.

O iniciado percorre esse caminho como quem afina um instrumento. No início, ele lida com a gravidade dos próprios impulsos, limites, desejos e ilusões. Aos poucos, com estudo, disciplina e meditação, ele eleva sua vibração interior, como o músico que transforma o ruído em melodia. Cada signo representa uma nota da escala evolutiva. O conjunto é a harmonia do caráter.

Essa jornada é necessariamente pessoal. Ninguém a percorre por ele. Mas o templo oferece as referências: as colunas são as marcas do percurso.

O Retorno ao Centro: Encontro com o Cosmos Interior

Depois de circundar simbolicamente o mundo, o iniciado retorna ao centro. Descobre ali não o vazio, mas um novo universo: o seu próprio mundo interior. Em linguagem hermética, encontra o microcosmo que espelha o macrocosmo.

O centro é o ponto onde o homem encontra o vestígio do Grande Arquiteto do Universo. Não como entidade externa, mas como presença interna que lhe confere unidade, propósito e sentido. A espiritualidade maçônica é, assim, uma espiritualidade do reencontro, não da fuga; do reconhecimento, não da submissão.

A física quântica oferece aqui outra metáfora poderosa: o vórtice de probabilidade colapsa em realidade quando observado. O centro interior é esse ponto de colapso, onde o homem decide quem é e quem deseja ser. O autoconhecimento transforma potencialidades em virtudes.

Exemplos Práticos para a Vida do Iniciado

·         No trabalho: as colunas lembram que cada decisão profissional tem dimensões morais, éticas e espirituais. O iniciado aprende a equilibrar ambição e integridade, resultado e humanidade.

·         Na família: o zodíaco simboliza ciclos. O maçom reconhece que relações afetivas também têm estações: momentos de plantio, poda, colheita e repouso.

·         Na sociedade: o símbolo do círculo aberto indica que a caminhada é coletiva. O maçom aprende a agir como mediador, pacificador e construtor de pontes.

·         Na vida interior: cada signo representa um aspecto psicológico. O iniciado torna-se observador lúcido dos próprios impulsos, capaz de transformá-los em virtudes.

Sugestões Construtivas para Uso Ritualístico e Instrucional

·         Debates em Loja sobre cada signo como arquétipo psicológico.

·         Meditações guiadas percorrendo o círculo zodiacal como jornada interior.

·         Peças de arquitetura relacionando signos a virtudes maçônicas.

·         Estudos comparativos entre simbolismo heliocêntrico e física moderna.

·         Oficinas herméticas integrando Caibalion, Platão, Aristóteles e Rito Escocês Antigo e Aceito.

Bibliografia Comentada

1.      ARISTÓTELES. Metafísica. São Paulo: abril Cultural, 1984. A obra clássica que fundamenta a compreensão dos quatro elementos e dos conceitos de ato e potência, essenciais para entender a relação entre símbolo e realidade no templo maçônico; a leitura ilumina a dimensão filosófica das colunas zodiacais como estruturas em constante atualização;

2.      COMTE, Auguste. Curso de filosofia positiva. São Paulo: abril Cultural, 1978. Comte critica frontalmente a astrologia e situa o pensamento moderno no campo científico, permitindo compreender como a Maçonaria preserva o simbolismo zodiacal sem aderir ao determinismo astrológico, posicionando-o como ferramenta de técnica de ensino e não como adivinhação;

3.      GEERTZ, Clifford. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: LTC, 1989. Geertz mostra como sistemas simbólicos moldam visões de mundo, oferecendo ao maçom uma lente antropológica para compreender como o zodíaco funciona como um código cultural e educativo dentro do Rito Escocês Antigo e Aceito;

4.      HERMES TRISMEGISTO. Corpus Hermeticum. São Paulo: Pensamento, 2008. Base fundamental do hermetismo, introduz o princípio da correspondência "assim como é acima, é abaixo", que permite relacionar o zodíaco maçônico ao desenvolvimento interior do iniciado e às noções modernas da física quântica;

5.      PLATÃO. A República. São Paulo: Martin Claret, 2001. Com sua teoria do conhecimento e o mito da caverna, Platão fundamenta o caráter iniciático do simbolismo, mostrando como o templo direciona o olhar do iniciado do sensível ao inteligível, do exterior ao interior;

6.      ROGER, Jean. Astrologia e culturas antigas. Lisboa: Estampa, 1995. Analisa o surgimento da astrologia entre povos antigos, permitindo cotejar seu uso prático com o uso simbólico no templo maçônico, iluminando a transição da adivinhação para a educação simbólica;

7.      TILLYARD, E. M. Cosmic Order. Londres: Penguin, 1950. Explora a concepção clássica de cosmos como ordem sagrada, uma referência imprescindível para entender o templo como microcosmo e o zodíaco como expressão da harmonia universal;

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