Charles Evaldo Boller
Despertar a consciência, na visão do Rito Escocês Antigo e
Aceito, é como acender uma lâmpada dentro de um grande templo silencioso. No
começo, a luz é fraca, tímida, quase imperceptível; mas aos poucos revela
formas, detalhes, caminhos e portas que antes estavam escondidos pela penumbra
dos hábitos e pelo peso das repetições automáticas. A Maçonaria não promete
iluminação instantânea. O que ela oferece é algo mais profundo: instrumentos
simbólicos, reflexões filosóficas e uma comunidade fraterna que servem como
espelhos para que o iniciado aprenda a ver a si mesmo com maior clareza.
Filosofia, rito e ética se entrelaçam nesse processo, formando uma teia que
sustenta o crescimento humano e espiritual.
A filosofia clássica ensina que a sabedoria
nasce do reconhecimento da própria ignorância.
Sócrates não buscava respostas prontas; buscava perguntas que despertassem.
Esse espírito investigativo se infiltra no maçom que se esforça para não viver
no piloto automático. Platão, com sua Alegoria da Caverna, lembra que muitos
confundem aparências com realidade. Um maçom desperto sabe que romper correntes
internas é doloroso, mas necessário para enxergar a Luz da Verdade. Aristóteles
acrescenta que o bem não se atinge apenas com reflexão, mas com hábito,
disciplina e prática diária. Dessa forma, a consciência desperta é o resultado
de um trabalho constante, como lapidar uma pedra bruta que carrega dentro de si
uma forma que ainda não se revelou.
No Rito
Escocês Antigo e Aceito, cada ferramenta e cada símbolo funciona como
metáfora viva. O malhete representa a vontade: nada muda sem o primeiro golpe,
sem a decisão firme de transformar-se. O cinzel simboliza o discernimento: é
preciso saber onde tocar, onde corrigir, onde aprofundar. O esquadro lembra que
todo passo deve buscar justiça; o compasso, que liberdade e limites caminham
juntos. Assim, a consciência desperta não é apenas um estado mental, mas uma
atitude diante da vida. Um aprendiz pode decorar os nomes dos símbolos, mas só
o maçom desperto, iniciado internamente, é capaz de vivê-los.
Quando falamos de despertar, falamos também de coragem. Coragem
para olhar a própria sombra, como ensinou Jung, e reconhecer que não existe luz
sem contraste. Coragem para admitir erros, rever intenções, ajustar
trajetórias. Coragem para perceber que cada ação, mesmo pequena, reverbera na
egrégora da humanidade, conceito que o Rito
Escocês Antigo e Aceito reforça ao propor uma fraternidade que
transcende fronteiras. Assim como na física quântica, onde o observador
influencia o fenômeno observado, o maçom aprende que seus pensamentos moldam
sua realidade moral. Essa percepção cria responsabilidade: não basta agir bem,
é preciso pensar bem.
Uma metáfora útil é imaginar a consciência como um jardim.
Quando adormecida, deixa crescer ervas daninhas: medo, orgulho, julgamento,
vaidade. Quando desperta, transforma-se em solo fértil onde virtudes podem
florescer. Mas nenhum jardim se cuida sozinho. É preciso regar, podar, limpar,
replantar. Da mesma forma, o maçom é um jardineiro de si mesmo: cultiva
paciência, segue podando impulsos destrutivos, aprende a colocar cada emoção em
seu devido lugar. O Templo Interior não se ergue com pressa, mas com
constância.
Algumas sugestões práticas podem tornar esse caminho mais
concreto. Uma delas é praticar o silêncio por alguns minutos antes de dormir,
permitindo que a mente revele padrões ocultos. Também é útil estudar um símbolo
maçônico por semana, relacionando-o a situações reais vividas no trabalho, na
família ou na Loja. Pequenos gestos, quando repetidos, transformam-se em
hábitos, e hábitos moldam o caráter. Além disso, prestar atenção às relações
fraternas ajuda a perceber que cada irmão funciona como um espelho: suas qualidades
inspiram, suas dificuldades ensinam, seus conflitos revelam partes não
resolvidas de nós mesmos.
O despertar não é privilégio de poucos, mas disposição de
muitos. Ele não acontece apenas em rituais solenes; brota na maneira como
tratamos pessoas, como usamos palavras, como enfrentamos desafios. A consciência desperta é a arte de viver com presença.
É reconhecer que cada gesto pode ser uma pedra assentada no Templo invisível
que construímos dentro e fora de nós. Como ensinou Marco Aurélio, um dos maiores
filósofos da autodisciplina: "A vida
de cada homem é o que seus pensamentos fazem dela." Se pensamos com
Luz, construímos Luz.
Bibliografia Comentada
1.
ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. Tradução Antônio
de Castro Caeiro. São Paulo: Atlas, 2009. Aristóteles ensina que a virtude
nasce do hábito e da prática constante, reforçando a ideia de que a Maçonaria é
um exercício diário de lapidação pessoal;
2.
HERMES TRISMEGISTO. O Caibalion. Tradução Múcio
Morais. São Paulo: Madras, 2017. A obra sintetiza princípios herméticos que
dialogam com a Maçonaria, como correspondência e vibração, ajudando o iniciado
a perceber a dimensão sutil do despertar interior;
3.
JUNG, Carl Gustav. O Eu e o Inconsciente.
Tradução Dora Ferreira da Silva. Petrópolis: Vozes, 1991. Jung apresenta a
noção de sombra e individuação, auxiliando o maçom a compreender a importância
de integrar partes ocultas da psique no processo de despertar;
4.
PLATÃO. A República. Tradução Maria Helena da
Rocha Pereira. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2006. A obra apresenta a
famosa Alegoria da Caverna, que funciona como modelo filosófico para
compreender o despertar da consciência, revelando a passagem das sombras
internas para a luz da verdade, princípio essencial no caminho maçônico;
5.
PLATÃO. Apologia de Sócrates. Tradução Jaime
Bruna. São Paulo: abril Cultural, 1979. Neste diálogo, Sócrates defende o valor
do autoexame, mostrando que a vida precisa de reflexão para alcançar dignidade;
seu pensamento inspira o maçom a cultivar humildade e vigilância moral;

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